Vou pensar rápido para não render muito assunto. Vou tentar me policiar porque o tempo é curto. Estava matutando agora, já com um certo distanciamento, sobre a fúria confessional que contaminou a consciência dos nossos homens públicos e outros nem tanto, nessa temporada outono/inverno 2005. Todo mundo queria contar um delitozinho aqui, outro acolá; um ilícito, que nem sabiam que era, vejam só!; uma mentirinha de nada, que tiveram de inventar para o bem de todos; um crimezinho eleitoral, uma bobagem que já nem se lembravam mais direito, enfim, qualquer coisa. Queriam falar.
Políticos, empresários, publicitários, suas respectivas, motoristas, secretárias, garçons e até presidiários foram atacados pela febre da vontade de falar. O negócio era contar tudo ou, pelo menos, tudo que consideravam conveniente contar. Parecia uma virose com alto poder de contágio. Uma gripe do frango, um surto de catapora. E haja cpi para ouvir tantas confissões!
Olhem só. Teve gente que mesmo não sendo convidada a falar, foi lá. Eu tenho de contar qualquer coisa! Preciso falar! Pelo amooooor de deus, me deixem contar também! E lá foi ele contar tudo, sentadinho, mordendo gulosamente a tampa da sua caneta bic. E teve gente que não pediu, mas foi. Foi e não falou o que se esperava que falasse, mas também não ficou calado. Mascou, mascou até sair alguma cascata qualquer.
Parecia véspera do juízo final. Todo mundo abrindo o verbo, rasgando a gramática, detonando o dicionário, no balcão do purgatório. E pra que tanta fúria?, pergunta o meu coração. E vai saber. Desconfio que falam porque sabem que em pouco ou quase nada isso vai dar. É claro que alguma coisa muda, lentamente, ao longo da história que, inventaram agora, é um processo. Mas, no que importa para cada um é que, no final, continua tudo na mesma para os mesmos.
Olhem só. Ouvi de um ministro do Tribunal Superior Eleitoral, que participava de um fórum técnico sobre reforma política, que a chance das denúncias de uso de caixa 2 nas campanhas eleitorais, pelo menos essas, terminarem em pizza, é muito grande. E não porque as cpis não tenham apurado, mas porque o Judiciário brasileiro tem um sistema de recursos tão irracional, que é quase impossível concluir um processo dessa natureza.
Ele citou como exemplo dois instrumentos que são tiro e queda nessas situações. O primeiro é o da suspensão de processo, que pode ser utilizado, entre outras alegações, por motivo de força maior. Suspenso o processo, segue-se outro recurso que trata da prescrição retroativa. Entendo que seja o mesmo que “prazo de validade vencido”. Não sei se estou certa. Se não estiver, que me corrijam. Esse instrumento também pode ser utilizado sozinho e é igualmente eficaz. E de recurso em recurso, o tempo passa, o povo esquece e a história acaba.
“Tudo fica no campo teórico da água de flor de laranjeira”, como concluiu o ministro. Não entendo bem o que isso quer dizer, mas desconfio que é uma variação em torno do mesmo tema da pizza. Um versão regional. Então que os confessos continuem derramando sua fúria verbal, neste espetáculo catártico, enquanto aguardamos o amanhã que virá. Se é que virá.
Hasta la vista.
2 comentários:
Não acredito que ninguém possa tomar conta de mim, por isso trabalho desde os 18. Cultura familiar, eu acho. Não espero nada do Estado, nunca esperei. Acredito em acordar cedo e ganhar o salário honestamente. Tem dado certo. Sou só uma cidadã, mas olha, Patrícia, eu não uso drogas, portanto não alimento o crime, sou só uma, repito, mas são alguns reais a menos para comprar armas, é alguma coisa. Nessa novela aí só posso garantir o seguinte: não voto mais. É triste, mas é alguma coisa: nenhum ator será reeleito com minha atitude. Sou individualista, o que faz o Ludus tremer e arregalar os olhos.
Querida Crise,
Estou com os olhos arregalados (rs). Não por você se declarar individualista, acho que no fundo, no fundo, todos nós somos. Mas preciso pensar um pouco mais sobre isso. E é o que vou fazer. Não quero te convencer de nada, mas, talvez, numa atitutde bem individualista, convencer a mim mesma de que vale a pena continuar acreditando. Depois compartilho com você e você faz o que quiser com a meu surto verborrágico.
PS: Gostei da estratégia de como boicotar os bandidos. Em 2003 boicotei os ladrõs de rádio. Depois que roubaram o meu, fiquei um ano sem ter som no carro. Só em 2005 me conectei novamente com o mundo. Durante um ano eles ficaram sem ter como roubar o meu rádio. hehehehe
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