sexta-feira, junho 29, 2007

Que nem

E é assim mesmo. O mundo gira e nós continuamos no mesmo lugar. Se sai um entra outro e quase nada muda. As manchetes do noticiário são as mesmas. Troca-se só o quem, às vezes, o onde também. E todos nós, em maior ou menor grau, delúbio, simone, mabel, luizinho, palloci, renan, roriz e outros. E todos nós, de um certo jeito, felipe, júlio, rodrigo, max, antonio, tomas, eron e suzane ou, pior, fernandinho, marcola, ivan.

É porque estamos todos ficando muito parecidos que nos assustamos tanto. A tela da televisão está virando espelho. Como num parque de diversões, a imagem refletida nos distorce, nos deforma, mas resta em cada uma delas um traço que é nosso também. Um traço que nos iguala. Não nos atos, mas na sua falta de sentido. Não nos atos, talvez nos gestos. Tão sem significado quanto. Só que pior, insignificantes. Inexpressivos. Ou então, na intenção. No que nos move ou nos paralisa, mas que está ali, em algum lugar, dentro de nós.

Aí, mesmo sem ir às vias de fato, nos tornamos iguais na vontade que às vezes dá de matar também. De estrangular. Na vontade que dá de chutar o balde, de rodar a baiana. De fazer de um jeito desajeitado, só porque é mais fácil, mais rápido. De enrolar também. De fingir que não está fazendo malfeito, mas fazendo. De enganar, blefar, engalobar, tapear, burlar, fraudar, iludir, fingir, marombar, como se não estivesse, mas estando. Nas pequenas coisas, mínimas, mas que na intenção se equivalem. Tornam-se todas parecidas, as pequenas e as grandes falcatruas. É disso que estou falando.

E, ainda assim, andamos na rua, com a cabeça erguida e os olhos bem abertos. Não para nos vermos melhor. Estamos na espreita, um vigiando o outro. Na tocaia, sempre alerta, para nos protegermos da maldade um do outro. E seguimos, figuras ilibadas, rua afora. Sonsos, não nos preocupamos mais com o que somos, mas só com o que aparentamos. Gil Brother terá razão? Estaremos todos desmilinguindo história afora, nos desfazendo, nos desmanchando, nos dissolvendo, nos destruindo, nos arruinando convenientemente?

Por isso estou andando é calada. Já perdi palavras, idéias, pensamentos, tudo. Nem ouso procurá-los agora. Quero é distância. Meus olhos não vêem o que não é mais possível explicar. Meus ouvidos não escutam o que a alma não quer sentir. Pronto. Vou hibernar. Entrar em recesso. Quando for razoável, abro os olhos novamente e volto a olhar pro mundo. Mas agora, agora mesmo, é como diz o Maguinho, amigo de uma amiga, não é que não dê, é só que não dá.

Inté, que hoje é só sexta e amanhã tudo continua.

Um final de semana longe da mesmice de sempre e repleto de boas novas.

sábado, junho 23, 2007

Não vou mais por aí

Tenho um problema: preciso marcar as minhas férias de julho. Todo ano reservo uns dias para esse período, que coincide exatamente com o recesso escolar dos meninos. Outros quinze dias tiro em janeiro e guardo mais cinco dias para a semana da criança, em outubro. Tudo friamente calculado para termos, ao longo do ano, pelo menos 25 dias inteiros para ficarmos juntos. Mas este ano estou com um problema: não consigo marcar minhas férias. Tânia já está ficando impaciente e desconfiada de que estou querendo boicotar o seu trabalho. Mas não é nada pessoal. Estou mesmo com dificuldade.

A primeira vez que ela me procurou, há quase dois meses, com o quadro de marcações na mão, senti um frio na espinha. Na hora não associei esse sintoma ao conteúdo da nossa conversa. Só registrei. Mas devo ter expressado um sentimento qualquer de desconforto, porque ela me olhou com espanto e repetiu: férias, Patrícia! Férias! Mas desconversei e disse que iria consultar o calendário escolar dos meninos e voltaria a falar com ela. Ninguém estava com pressa. Ela saiu meio murchinha, mas não disse nada. Passaram-se uns dias e ela voltou. O quadro em excel, com barras coloridas, já estava quase todo preenchido. Só algumas linhas ainda estavam em branco, entre elas, a minha.

Tânia é sempre bem humorada e divertida. No dia a dia, ela tem de lidar só com problemas: é a marcação de ponto errada de um funcionário; um desconto indevido no contracheque de outro; ou alguém que ligou pedindo um serviço que está atrasado e mais alguns abacaxis que desconheço. E ela faz tudo isso com uma leveza invejável. O mundo está desabando sob seus pés e ela saltita entre os pedaços de chão que restam e atravessa seu caminho sem ameaçar ninguém. Por isso, quando chega a folha de marcação de férias, ela sente que é o seu momento de glória. Se aproxima de nós, como uma fada que vem com sua varinha de condão realizar todos os nossos sonhos.

Mas percebi, quando ela se aproximou de mim pela segunda vez, que estava um pouco tensa. Nem rendeu assunto, quis saber só se já tinha me decidido. Resolvi também não estender a conversa, porque já estava pressentindo que teria dificuldades. Disse um vou olhar isso, meio entre os dentes, e voltei para o computador. Neste dia não senti o frio na espinha, foi diferente. Senti um peso nos ombros, como se estivesse prestes a decidir o destino do mundo. Que besteira! - pensei. São míseros cinco dias fora da rotina, para fazermos o que bem entendermos. Poderíamos até pensar numa viagem, por que não?

Mas quando essa idéia me passou pela cabeça, arrepiei. Ops! Tenho um problema! Foi aí que percebi que estava em apuros. Marcar as férias significava exatamente isso: marcar uma viagem. Não a viagem dos nossos sonhos, claro, porque o mar não está pra peixes, ou melhor, o céu não anda pra andorinhas, mas só uma viagenzinha qualquer. Uma saída pelas redondezas ou uma esticada até o litoral. Mas que seja, ainda assim, significará sair de um lugar onde estou para outro onde vou estar. E é aí que mora o problema. O meu problema. Fiz até um diagnóstico, de leigo, mas um diagnóstico: síndrome do imprevisto. Só de pensar em férias, viagem, sair de onkotô e ir pronkovô, os sintomas aparecem: náusea, enxaqueca, arrepios, dores difusas e outros males.

Não sou assim, estou. Antes, o imprevisto era um imprevisto mesmo. E o encarávamos como uma oportunidade para enriquecermos nossa biografia. Conhecer cidades que não havíamos planejado; pessoas, as mais improváveis possíveis; experimentar quitutes dos quais nunca havíamos ouvido falar; e assim por diante, enquanto o problema, o imprevisto era superado. Mas hoje, o imprevisto é o mais certo de acontecer. Já saímos de casa na expectativa: o que vai ser dessa vez? Ficamos tensos, mau humorados, olhando pros lados com cara de pouca conversa. Horrível! Não quero isso. Não quero marcar minhas férias. Já escolheram por mim: prefiro a minha entediante rotina.

Não quero me aventurar nas estradas esburacadas, me arriscar nos desvios de chão de terra, levando fechada de caminhoneiros mal educados e prepotentes. Não vou mesmo encarar 400 quilômetros de asfalto, nem cem, correndo o risco de topar de frente com um engraçadinho qualquer que se acha o dono da estrada e anda na mão que bem lhe convier. Nem quero perder tempo dentro de um ônibus apertado, mal ventilado, com pacotes despencando sobre nossas cabeças a cada curva mais fechada. Isso, pra não dizer dos chatos que falam alto o tempo todo, contando detalhes da sua vida que não interessam a ninguém, além de outras inconveniências.

Estou aborrecida mesmo. E tem mais: de avião, nunca! Vou eu parar num aeroporto qualquer, com mala, sacola, menino, pra ficar fincada numa cadeira desconfortável por 8, 10, 12 horas e ainda ter de brigar na fila para arrumar lugar no avião? Já fui, não vou mais. Agora é ruim, hem? Não é imprevisto, como disse, é certo de acontecer. E pior, com a televisão filmando tudo e depois mostrando pro Brasil inteiro: aquele bando de desarvorados e melancólicos passageiros, com a cara amarrotada; desfalecidos em cima de malas e pacotes; agachados num canto do corredor; mal acomodados em cima de carrinhos de bagagem, com as mãos segurando o queixo e os olhos perdidos num ponto infinito; se arrastando nas filas do check-in e ainda tendo de achar bom, porque estão todos vivos. Não vou me expor nem expor meus meninos a essa tragédia de luxo.

Percebo que estou limitada na minha liberdade de sair por aí. Não sei se por capricho meu ou se pelo persistente desrespeito de seguidos governos ao nosso direito de ir e vir. Já estou ficando até confusa. Será que temos mesmo esse direito, com tanta criancinha passando fome, tantas famílias sem terra, tantos homens sem emprego, tanta miséria por esse mundo afora todo? Será? Será que não estou sendo muito egoísta demais, querendo tirar férias, viajar e ainda mais viajar confortável e seguramente? Ai ai, viu? Então, está bem. Depois conto pros meninos. Segunda-feira vou falar com a Tânia que não vou mais tirar férias. Vou ficar só trabalhando. Se precisar até fazendo hora-extra. Será que isso vai resolver os problemas do Brasil?

Um finzinho de semana com ares de férias. Sem compromisso, sem hora marcada, sem rumo e sem direção.

Buenas e tantas.

domingo, junho 17, 2007

Passado incerto, do futuro certo

Ufa! Vou mudar de assunto. Vou contar uma história. Uma parte é verdadeira, outra parte eu mesma inventei. Quem começou a me contar essa história foi a Bel, que está me ajudando a fazer uma revisão da gramática portuguesa. Bom, pelo menos ela pensa assim e eu deixo, mas, na verdade, ela está é me ensinando mesmo, porque tudo que sei de Português aprendi de ouvido ou só de vista, lendo um livro aqui outro ali. Agora é que estou entendendo o porquê de tantas regras. Bom, mas isso não vem ao caso, principalmente porque só estou começando meus estudos e ainda vou dar muita manota até apreender todos os conhecimentos que Bel tenta me passar. E, agora, o que me interessa mesmo é a história, como sempre.

Então, a Bel é muito atenta a tudo que diz respeito à língua portuguesa e ela observou que as meninas do telemarketing estão abandonando o péssimo hábito do gerundismo. Aliás, para Bel não era um hábito, mas uma escolha política. O gerundismo é o tempo que melhor expressa a cultura contemporânea da falta de compromisso com tudo na vida. O preguiçoso vou estar encaminhando não assume nenhum compromisso de tempo. Pode ser agora, hoje, amanhã, depois de amanhã ou um dia qualquer, o que, aliás, é o que mais acontece. Um dia, quem sabe. Mas o gerundismo está caindo em desuso. Descobriram um novo tempo verbal: o futuro do pretérito!

Isso pode ser uma boa notícia, afinal, usamos esse tempo quando tentamos evitar uma ordem imperativa e, mais do que isso, demonstrar alguma polidez: Você poderia me passar aquele livro? É chique, não é? Em vez de dar uma ordem: passe-me aquele livro!, oferecemos uma opção ao nosso interlocutor: você poderia. E ele escolhe se quer ou não passar, mas, normalmente, é assim que conseguimos convencê-lo a ser educado e a passar o livro de boa vontade e até feliz por ter sido tão bem tratado. Mas, o futuro do pretérito esconde armadilhas. Ele pode ser usado também quando nos referimos a um fato futuro em relação a outro fato passado, ou a um fato futuro, mas duvidoso, incerto: eu passaria, se você não fosse tão imprudente! Seria mesmo muito educado se eu passasse esse livro! Ou seja, o mais provável é que não vai passar, não vai fazer nada. Passaria, mas não passa. E aí voltamos à mesma vontade política que, anteriormente, determinou a escolha do gerúndio como o tempo exemplar do descomprometimento com tudo. Viram o perigo?

Mas a história é a seguinte: a Bel precisou ligar para uma dessas empresas de telefonia. Isso já é um problema, vocês sabem disso, não sabem? Mas ela é corajosa e ligou. Assim que a menina atendeu do outro lado da linha, a Bel começou a falar e a expor o seu problema, mas foi subitamente interrompida:

- Um momento, por favor.

Silêncio. A Bel ficou aguardando, ansiosa. E aí veio a bomba:

- Qual seria o seu nome?

- !??!?

Bel entrou em estado de choque. Como assim? Qual seria o meu nome. O que ela está querendo dizer? Será que ela está querendo mesmo ouvir essa história? Não é possível! Vou conferir:

- Ahn? Desculpa, não ouvi direito.

- Qual seria o seu nome, minha senhora? Por favor.

Então, era isso mesmo que ouvira. Ela queria, de fato, saber qual seria o nome da Bel. Nesses casos, quando a pessoa tem certeza do que quer, sou da opinião de que não devemos nos negar. Se ela queria saber, acho que Bel deveria contar. Então foi mais ou menos assim:

- Está bem menina. Se você quer saber, vou te contar. Fui a primeira filha e, quando nasci, minha mãe não teve dúvidas. Logo que meu pai entrou no quarto, ela disse:

- Olha que gracinha! Não é a coisinha mais bunitinha da terra? Vai se chamar Leoma!

Meu pai olhou com cara de interrogação para a minha mãe:

- Ahn?
- Leoma, homem de deus! Leo de Leonardo, seu nome e ma de Marília, meu nome: Leoma!
- Ah! – disse meu pai com cara de entendido, mas com um ar desconfiado também: será que o parto mexeu com a cabeça dessa mulher? Leoma! Onde já se viu isso? Que coisa horrorosa para a coitada da criança.

- E aí? O que você achou? – quis saber a minha mãe.
- Acho esquisito! – disse meu pai sem papas na língua. Queria um nome mais clássico. Dulcinéia! Olha que beleza! Um nome doce!
- Cruzes! Tem dó. E o que significa Dulcinéia? Nada, não diz nada para nós. Leoma é a forma composta do nosso amor.
- Ahn? Coitado do nosso amor, mulher! E coitada dessa criança. Pensa essa coisinha bonitinha indo para a escola. Aí perguntam o seu nome e ela diz: Leoma! Parece Leona, mulher brava, rude, grosseira! De jeito nenhum!

- Aí amiga, posso te chamar assim, não posso? – quis saber a Bel.

- É que...

- Não, não fique constrangida. Afinal, recordar também é viver. Não me custa nada revelar essa parte da minha história para você. Afinal, é só um detalhe em relação a tudo que tenho para te dizer ainda.

- Mas...

- Calma. Vamos lá: nisso, enquanto meu pai e minha mãe discutiam sobre o melhor nome que poderiam me dar, entra no quarto minha vó. Pegou a conversa andando, mas entrou de cara:

- Leoma! Tem dó Marília, perdeu o juízo na sala de parto! De jeito nenhum, vamos devagar. Essa menina deve ter outro futuro. Olha que gracinha! E não é que ela é a cara de minha mãe. Taí, acho que vocês deveriam prestar uma homenagem a bisa: que tal Leocádia!

- Aí quem perdeu o juízo foi meu pai. Quase pôs minha avó quarto afora. Só sei que fiquei quase uma semana sem nome. As pessoas me chamavam de Bunitinha. E a bunitinha? Tá mamando direitinho? Meu pai emburrou prum lado, minha mãe pro outro e eu fiquei no meio dos dois, sem nome, nem documento. Foi aí que a Bá, a mulher que ajudou minha vó a criar minha mãe e, depois, ajudou minha mãe a me criar, entrou na história. E ela, com toda a sua autoridade de ama de leite, falou com minha mãe:

- Não tem nada disso não, Marilinha. Não tem nada de Leoma, Dulcinéia, Leocádia ou qualquer outra Marocas da vida. Essa menina já nasceu com o nome dela. Olha se não é? Olha se o sorrisinho dela não é um sorrisinho de Isabel? É claro que é. Pronto. Essa menina se chama Isabel. Sempre.

- Meu pai estava no quarto e ouviu silenciosamente a sugestão de Bá. Minha mãe, já cansada de ficar emburrada tanto tempo, ouviu calada também. Depois, os dois se olharam, olharam para a Bá, olharam para mim. Riram e concordaram.

- Não é que ela tem mesmo um jeitinho de Isabel? É isso mesmo. Pode registrar! Isabel – disse minha mãe.

- Então foi assim, amiga. Meu nome seria Leoma ou Dulcinéia ou Leocádia. Mas é Isabel!


Uma semana na real para todos. Sem futuro do pretérito nem gerúndio nem sonhos nem ficções. Só o que vier e que venha tudo em paz. Já estará de bom tamanho.

Buenas.

quinta-feira, junho 14, 2007

Os donos da voz

Foto: essa é minha.

Ainda sem perder o foco e com várias certezas sobre as dúvidas que terei de enfrentar proximamente. Uma delas: porque a grande imprensa brasileira não discute as políticas públicas de comunicação? Vocês sabiam que neste ano da graça de 2007 estão vencendo as outorgas de 28 emissoras de TVs e de 153 canais de rádios, entre elas a Globo, Record, Bandeirantes e Cultura? Vocês sabiam que a Subcomissão Especial da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados aprovou, no último mês de maio, novas regras para a renovação e outorga de rádios e TVs que já valerão para os processos que chegarem à Câmara a partir do dia 1º de julho? Vocês sabiam que os trabalhos dessa Comissão tiveram início há três meses e que já foram realizadas seis audiências públicas para discutir essa questão e que existem propostas até bastante avançadas para atualizar essa legislação?

Essas coisas a gente não fica sabendo assim, distraidamente, né? Temos de correr atrás para buscar informação. Mas pudemos acompanhar detalhadamente, com páginas e páginas de matérias de enviados especiais e horas e horas de debates no rádio e na TV, sobre a recusa de Chávez de renovar a concessão da RCTV venezuelana. Quem é que entende uma coisa dessas? Então vamos por parte. As concessões públicas para rádio e TV são licenças temporárias, concedidas pelo governo para uma determinada empresa transmitir conteúdos por canais de rádio e TV. No caso das televisões brasileiras, conforme explica o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), essas concessões têm validade de 15 anos e, para os rádios, de 10 anos. E são esses prazos que estão vencendo para algumas empresas. Mas quais são os critérios para que a renovação seja aprovada? Quais são os critérios para aprovação de uma concessão de rádio e TV no Brasil? Mais dúvidas.

Uma certeza: não acho que o Congresso vá negar a renovação para nenhuma delas, apesar de criticar, em várias ocasiões, o comportamento da imprensa brasileira. E, às vezes, até com razão. Mas isso não significa que essas questões não devessem estar sendo amplamente discutidas com a sociedade brasileira, inclusive com o apoio e a participação dos meios de comunicação de massa, como as redes de rádio e TV, os jornais de circulação nacional e assim por diante. Isso é o que eu penso, mas não é o que a grande imprensa brasileira pensa. Ela sabe que tem um papel relevante e essencial na consolidação das sociedades democráticas. Sabe que, além de organizar e dar visibilidade às grandes demandas da sociedade na esfera pública, influencia fortemente no agendamento e enquadramento desses temas, contribuindo, de forma decisiva, na formação da opinião pública. Ela sabe disso tudo.

Sabe, mas não se dispõe, com exceções, é claro, a assumir um papel responsivo nesse jogo. Ela não admite, em hipótese alguma, qualquer tipo de crítica, que dirá de mecanismos de controle democrático. Rápida no gatilho, qualquer tentativa nessa direção é traduzida por ela, sem nem pestanejar, como sendo mecanismos de censura, de cerceamento da liberdade de expressão. Essa é a senha para barrar os desavisados que, eventualmente, tentam influir na linha editorial das publicações e programações de rádio e Tvs, propondo um debate mais plural sobre temas espinhosos para a mídia.

E não sou eu que penso que ela pensa assim. É assim que é. Recentemente os jornais publicaram uma notinha de pé de página sobre uma pesquisa realizada pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi), com o apoio da Fundação Ford, sobre Mídia e Políticas Públicas de Comunicação. A conclusão da pesquisa é a de que, de maneira geral, os meios de comunicação brasileiros ainda dedicam uma atenção seletiva e parcial aos temas mais polêmicos das Políticas Públicas de Comunicação, como a regulação de conteúdo e a propriedade cruzada dos meios. E porque isso é grave? Exatamente porque os meios de comunicação têm um papel fundamental no debate dos grandes temas de interesse público, pois são eles que dão visibilidade a esses temas, que organizam a discussão, etc. etc. etc. Mas, como qualquer outra instituição, nem sempre os meios de comunicação conseguem representar um papel isento no debate público. Por isso seria importante que eles também fossem passíveis de controle democrático, por meio de regulamentações, amplamente discutidas pela sociedade, que estabelecessem os critérios e limites para sua atuação.

Mas é querer demais da nossa vaidosa imprensa, não é não? Enquanto isso, vamos acumulando dúvidas e desinformação. Vocês sabiam, por exemplo, que a Anatel está criando um grupo de estudos para elaborar uma nova licença para o serviço de TV por assinatura? Sabiam que essas mudanças poderão colocar em risco os canais comunitários, legislativos, universitários e outros previstos na lei do cabo? Que as mudanças não estão levando em consideração os debates sobre a definição de um novo marco regulatório para o setor? Que as mudanças poderão ainda abrir caminho para as operadoras de telefonia atuarem nesse mercado, bem como para o capital estrangeiro?

E assim caminhamos. Até o dia, se é que haverá esse dia, em que um vento mais forte vai soprar e espalhar os ares da democracia pelos quatro cantos dessas plagas brasileiras.

PS: Esse negócio de pensamento único definitivamente não funciona e cansa demais. Já estou ficando enfarada de pensar sempre o mesmo assunto. No próximo fim de semana prometo virar o disco.

Inté

sexta-feira, junho 08, 2007

Eu acredito em notícias!

Já disse que meu teclado está programado para não perder o foco. Não vou nem tentar escapar, porque será inútil. Mas vou ficar rodeando o mesmo tema e passear pelas trilhas que surgirem ao longo do caminho. Sem pretensão. Sem compromisso. Vou fazer como Caetano, andar contra o vento, por entre fotos e nomes. O sol não se reparte mais como antes. Mas a luz que vem da televisão se espalha pela sala. Explode em guerras, protestos e marchas. Em caras de presidente, em longas filas de espera. Em bocas, pernas e banners. Luminosos e merkel, putin e bündchen.

A banca de revistas agora é em realtime e está on line. Mas, assim como antes, me enche de alegria e preguiça. Pra que ler tanta notícia? E por que não? Eu vou. Eu tomo um capuccino de baunilha. Ele pensa no dow jones. E o som do rádio me distrai. Eu vou. Por entre taxas e câmbios. Sem livros e sem outras referências. Sem links nem celular. No coração do planeta. Ele nem sabe, até pensei em gravar um podcast. O som das ruas. Dos carros, dos bares, das cadeias, das calçadas. Eu vou. Agora. Por que não?

Mergulhada num mar de informações, respiro versões, visões e farsas. Delas tiro um ponto, acrescento uma vírgula e invento outra história. Quem ainda acredita em notícia? É livre a expressão. Independentemente de licença. O pensamento não tem restrição. Navega na rede. Google nele! Sai por um portal. Uol, uai, g1. Escapa pelas janelas. Youtube, blogblogs, fóruns, e-mails. Pimenta nos olhos, lá no mundo dela, jamill, verbo transitivo, obvius e blonicas. Interney, underground virtual, as latrinas da vida. Pensar enlouquece. Pense nisso. Espera, estou pensando.

A sopa de letrinhas está cheia de temperos. Tem todo tipo de gosto. Virou obra coletiva. Wikinal. Now. Internacionalizou-se. Pluralizou-se. Globalizou-se. Por isso nem Chávez, nem bush. Nem as rctvs, cisneros, globos, cnns, warners, sonys e bbcs. Nem as públicas, nem as estatais, nem as privadas. Mesmo que tentem. Hoje a voz tem muitos donos. Eu não acredito em notícia. Acredito em notícias. Várias versões. Estou vivendo perigosamente, sem dúvida. Rompi com a ordem das editorias. Minha lente agora é multifocal. Substitui a objetividade pela subjetividade. E é dela que tiro a minha compreensão do mundo. Estejam servidos!

Um fim de semana na diversidade, sem legendas. Ao som das notícias em várias línguas e versões.

Buenas.


PS: E pra não dizer que não falei de flores, vai um linkizinho só para distrair. Basta um computador e um fone de ouvido. Mas tem que ser com o fone de ouvido e de olhos fechados! Agora divirtam-se na vida real com uma experiência inédita de realidade virtual. Com vocês, o Barbeiro Virtual! Como separar uma da outra?


sábado, junho 02, 2007

A vida como ela é

Foto: pesquei na rede. soprou um vento e ela caiu aqui

Por exemplo: tem gente que tem fé. Acredita de olhos fechados. Quando tromba de frente com um problemão, agarra com São Judas Tadeu e vai embora. No que der é o que tinha que dar. E está certo assim. Mas se é problema menor, se está enrolado é com dívidas, pega emprestado mais um pouco e chama Santa Edviges para negociar. E, quando quer sossego, mas o bicho está pegando, é melhor São Paulo e se o que está apurrinhando são os estudos, aí é com São Tomás de Aquino. É um santo para cada pranto.

Agora, tem gente que acredita, mas desconfia. Se dá de frente com o problemão, chama o santo, mas toma providências. Corre atrás de um jeito qualquer, um jeito que, parece, pode ser a solução. Mas, quando encontra, desconfia. Apela para outro santo e toma novas providências. Descobre outro jeito, mas quando olha de perto, desconfia de novo. E assim vai, até o problema não ter mais jeito e o melhor é deixar para lá, ou até o problemão virar probleminha e nem precisar mais de santo para resolver. Às vezes, o problemão deixa até de ser problema e vira solução. Mas aí é que ele desconfia mesmo. E continua correndo atrás, o tempo todo. Desconfiando.

E tem outro tipo de gente que nem acredita nem desconfia. Só tem uma certeza: é em vão. Seja qual for a penca de problemas que terá para se ocupar, não se ocupa. Cria outros, mas não se ocupa. Já sabe de antemão que será uma luta inglória. Se antecipa e pula de fase. Parece fácil, mas é um sofrimento puro. Talvez, o maior deles, porque esse tipo de gente tem uma clareza no olhar para encontrar os problemas que é uma coisa espantosa. Pode ser até instinto de preservação. Precisa estar mais antenado do que todos, para perceber as dificuldades e passar por cima, se não quiser ser engolido por elas.

Esse tipo de gente padece eternamente. Só não pena tanto quanto procura, porque em vez de viver, encena. Se distancia. Está bem dentro do olho do furacão, rodeado de confusão, mas segue impunemente, como se ali não estivesse. E ri de quem o adverte dos riscos que está correndo. Tripudia de quem acredita, porque esse não passa de um cego. Desfaz de quem duvida e desconfia, porque, no fundo, no fundo, esse é o mais crente dos crentes. Acredita piamente que existe algum jeito, o melhor de todos, que vai dar cabo ao problemão. Se diverte no seu cinismo, como a maioria daqueles que hoje estão por aí nos rondando. De longe. Nos planaltos. Rindo da nossa suposta ignorância ou ingenuidade. Os vejo de longe também e sei que, no lampejo, sofrem.

Por isso, já não me preocupo mais com eles. Já não sou crente, nem cética. Muito menos cínica. Reconciliei com a vida e aceito-a que venha como vier. No mais das vezes, tudo me diverte. Se me aborrece, me aborreço. Se me irrita, me irrito. Se me entristece, entristeço. Mas, no mais das vezes, tudo me diverte.

Um domingo do jeito que ele vier para todos. Na paz.
Inté.