sábado, agosto 20, 2005

A vingança dos sofistas

Essa muvuca de Brasília já está me dando nos nervos. Já não sei mais quem denunciou quem; não sei quem é vítima e quem é o algoz; nem se o dinheiro era da igreja ou de campanha, se era de caixa 2 ou do balcão de negócios; não sei se foi o fulano que entregou ou se foi ele quem recebeu a mala; nem qual a história que está sendo contada, já não sei mais. São tantas entre tantas que estão aí iniciadas, que já estou misturando os enredos e as personagens. É um disse-me-disse danado. A revista Caras deveria soltar uma edição especial com o quem é quem dessa novela, para nos ajudar a retomar o fio da meada.

Mas agora, pensando bem, nem sei se quero mais. Acho que vou acabar concordando com o meu amigo Ludus. Tudo isso que está acontecendo não passa da vingança maligna dos sofistas. Na última sexta-feira, ele soltou essa e foi embora para Patos. Como assim? De qual núcleo são os sofistas? Do Correio? Do Mensalão? Do Bingo? Quem os denunciou? Em qual história eles estão? Ele nem ouviu.

Então, porque hoje é sábado e eu estou por conta do à-toa - pelo menos agora - resolvi pensar sobre a vingança dos sofistas. Anhan! Nada que um bom dicionário de filosofia não desvende. Quem são os sofistas? Pasmem-se. Eram intelectuais que viviam em Atenas, em meados do século V, escandalizando os filósofo da época, ao fazer do saber uma profissão, oferecendo aulas de retórica e de eloqüência aos jovens da classe dirigente, em troca de algumas moedas.

Dominando a técnica, os novos sofistas, do grego sophistés, que significa sábio, eles eram capazes de produzir argumentos aparentes (geralmente intrincados) para defender qualquer proposição, fosse ela verdadeira ou falsa. Com essa prática, desmascararam as pretensões dos filósofos puros de chegar a verdades absolutas, mostrando que todas supostas “verdades” eram construções humanas, com o fim de promover interesses vitais. A sofística não é, portanto, uma busca séria da verdade, mas um jogo intelectual. Há controvérsias, é claro, mas aqui não vem ao caso. O fato é que essa verdade é também uma versão possível.

Uma prova de que os sofistas se deram muito bem, mesmo execrados pelos filósofos puros, é que há evidências da presença deles até na história da filosofia chinesa. Na cartilha da escola das Formas e dos Nomes (Hsing Ming chia), por exemplo, no capítulo 33, eram apresentados alguns exercícios para serem praticados pelos ávidos estudantes. Eram propostas teses, que deveriam ser defendidas ou criticadas pelo aluno, como por exemplo: “há plumas no ovo”; ou “a sombra do pássaro que voa não voa” e mais, “se se tira a metade de um bastão a cada dia, ele não desaparecerá em uma miríade de anos” e assim por diante.

Voltando à terrinha, o que estamos assistindo hoje parece mesmo praga de sofista. Cada oitiva de uma CPI é uma história que é contada, com princípio, meio e fim, com seus próprios personagens e cada vez em maior número. São verdades que vão sendo construídas de acordo com o interesse de cada depoente. E são tantos os depoentes e tantas as histórias, que já não sabemos mais quais são as de verdade ou quais são as de mentira. E quanto mais bem preparado ou mais eloqüente é o depoente, mais provável a história nos parece.

Mas quando paramos um pouco para pensar, quando tentamos retomar capítulo por capítulo para ver qual encaixa onde, tudo isso parece mais é uma grande confusão mental. É um jogo intelectual ou político, como queiram. A cada dia estamos chegando perto de uma verdade e, cada vez mais longe, desconfio, da verdade absoluta.

Nessa mesma linha, mas aí pegando o verbete “sofisma”, encontraríamos outras evidências do que Ludus chamou de “a vingança dos sofistas”. Mas para demonstrar essa tese, meus amigos, precisaria de mais tempo. É um trabalho de cão, pois teria de voltar aos depoimentos de um por um para ir idenficando, em cada um deles, quais os gêneros adotados, pois são vários. Pensando bem, é um desafio e tanto. Já estou ficando animada. Acho que vai ser emocionante. Mas não hoje. Um dia, quem sabe.

Bjins.

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