quarta-feira, dezembro 07, 2005

A terceira margem

Olhem só, outro dia desses aí pra trás, fomos caminhar com Guimarães. Não o Ulisses, o Rosa. Entramos só de passagem pela estória de Lélio e Lina e fomos direto para A Terceira Margem do Rio. Uau! Antes tinha na cabeça uma birra teimosa de Guimarães e do Mário de Andrade de Macunaíma. Era com o jeito estranho de eles escreverem. Achava que era pirraça, para atrapalhar nosso caminho nas histórias. E pra mim, me interessava muito mais as histórias. De como os personagens iam surgindo, se encontrando, se envolvendo, se movendo dentro dos cenários inventados e, às vezes, desaparecendo sem mais. Ainda me interessam. É o como de Lisbela.

Só que depois fui aprendendo que as palavras também são fundamentais, claro! Foi preciso dar muitas vezes com os burros n'água, aqui na vida real, para entender isso, que as palavras, mesmo que parecidas no dicionário, são sempre diferentes. Tem sempre a hora certa de se usar uma palavra. E tem também o lugar certo para ela entrar sem provocar ruídos. Elas são, portanto, como personagens da história. E assim é em Guimarães. Por isso só agora, recentemente, me animei a ler seus textos. Livrei-me da birra. Menos uma.

Então, lemos e relemos a história do homem que foi e não voltou, sem ter ido a lugar algum. Ficou se indo ali no seu barquinho, vagueando na terceira margem do rio. Dias depois, me deu um clique. Olhem só, se não estamos também numa canoinha, zanzando na terceira margem do rio. Desde que me entendo por gente, que o Brasil está indo. De repente, muda alguma coisa e a gente pensa, é agora que vai! E não vai. Nem para um lado, nem para o outro.

É claro que mudamos. Igual o homem do barco mudou, ficou velho, barbudo, minguou. Zoando ali no rio, parecia que o tempo não passava. Que só as águas corriam rio abaixo. Mas passava. E pra nós também, né? O Brasil multiplicou-se, isso é inevitável, principalmente nos trópicos (rs). Se espalhou e cresceu, mas sempre ali, na inércia da terceira margem. Foi se indo.

Agora, de novo, nós pensamos, dessa vez vai. Na nossa democracia roseana - não a de sarney, mas a de guimarães -, encontramos uma alternância que, acreditamos, levaria o nosso barco para algum lugar. Ou ia atracar numa das margens ou ia embora seguindo um destino novo, ainda não-encontrável. Não foi. Foi uma droga. Que coisa hem siô! E tamos nós lá de novo. Zanzando no meio do rio. Não fomos nem ficamos nem voltamos. Continuamos indo indo indo a lugar nenhum.

Aí li outro dia no jornal um comentário do brasilianista Kenneth Maxwell. Ele fez uma palestra, em Washington, sobre "Lula, PT e o futuro da democracia brasileira". Não sei se ele está certo, mas quem está de fora tem uma visão diferente de quem está dentro e que, às vezes, ajuda a entender o que rola aqui pertinho e ninguém percebe. E o carinha disse, lá em Washington!, que a nossa crise tem cheiro de boicote. Igual na Venezuela. Huahuahua! Tem "elementos de natureza conspiratória".

Vou copiar: "É curioso olhar para a história do Brasil e ver que, quando as reformas chegam até certo ponto...bingo! Acontece uma crise. É o que eu chamo de conspiração do sistema, não necessariamente de pessoas". É curioso mesmo. Por isso ficamos aqui, esquentando o sol na terceira margem do rio. Ficamos não indo a lugar nenhum. Parece que sofremos do "grave frio dos medos". Na hora que o bicho vai pegar mesmo, dá o desatino e corremos do pau. E nós rio abaixo, rio a fora, rio adentro.

Uma boa navegada pra todos.

Até o próximo porto!

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