domingo, junho 04, 2006

Nosso herói foi pro espaço!

De noite ou de dia,
firme no volante,
vai pela rodovia,
bravo Vigilante!
(Música tema do seriado brasileiro O Vigilante Rodoviário)

Vichi, me lembrei de uma coisa muito antiga. Não sei se me lembrei de fato ou se outros é que se lembram e eu tenho é uma vaga lembrança da lembrança dos outros. Não sei. Mas eu tenho uma imagem e desconfio que não foi inventada, mas vivida mesmo. Vi-me vendo uma telefunken na sala, a primeira da rua. Vi os meninos em volta e, de algum lugar, de dentro da sala ou de fora dela, só de passagem, eu olhando para a tela da televisão. E vi-me vendo o simca chambord 1959 do Inspetor Carlos e depois o próprio Inspetor Carlos em pé ao lado do carro e, do lado dele, o Lobo, um baita pastor alemão, muito parecido com Rintintin.


Tive de ir fundo buscar essas lembranças, flashs em preto e branco do primeiro seriado nacional: O Vigilante Rodoviário. Mas foi por um bom motivo. Estava intrigada. O que aconteceu foi que assim que Aninha desligou o telefone, depois de comentar comigo, entre pasma e indignada, a notícia da aposentadoria do primeiro astronauta brasileiro, a primeira coisa que me veio à cabeça foi a música do Inspetor Carlos – de noite ou de dia... E esse trecho de música, pedaço de nada, ficou rodando na minha cabeça como um long-play arranhado tocando numa vitrola Victor. Não parava nem ia pra frente. A solução era só uma: Google nela!

Já quase enlouquecida com o mantra ying-yang, me embrenhei pelo universo virtual atrás de informações mais precisas sobre a vida ilibada de Inspetor Carlos. Queria porque queria tentar descobrir o que esse personagem tão singelo teria a ver com o nosso astronauta brasileiro. Fui aos fatos. O Vigilante Rodoviário ficou no topo do sucesso durante mais de um ano, com 72% de audiência, mas foi cancelado em 1962 por falta de patrocínio. Foram 38 episódios, exibidos logo após o Repórter Esso, pela extinta TV Tupi. Bom, até aí, só um tema para um belo case, se é que ainda não foi feito por algum estudante de comunicação.

Continuei minha empreitada, atrás de mais informações sobre o personagem. O herói da nossa história era interpretado por um ator amador, Carlos Miranda. Imagina o susto que ele não levou quando recebeu o convite para fazer o personagem num seriado para TV!! E sabia lá o que era isso? Mas surpresa pouca é bobagem. Deve ter barbarizado mesmo foi com o sucesso de Inspetor Carlos. Tá certo, ele parecia um elvis, tinha um belo carro, uma bela harley davidson 1952, um belo cachorro e era totalmente do bem. Podia querer mais alguma coisa? Podia? Podia.

Depois de sair do anonimato, da noite para o dia, e de conhecer e se deleitar com a fama durante mais de um ano, Carlos Miranda queria mais. Não um outro personagem, não mais e mais sucesso, não uma aposentadoria muchocha da nascente televisão brasileira. Carlos Miranda queria mais só uma coisa: ser o Inspetor Carlos. Não o herói, mas um policial rodoviário de verdade. O ator fora contaminado pelo encanto de seu próprio personagem. E depois de um período de transição, largou o palco e entrou para a Academia de Polícia. Virou o que já era: o Inspetor Carlos. Abandonou a fantasia e foi à luta. De noite ou de dia, até se aposentar.

E daí? Daí pra frente foi o mantra ying-yang que me ajudou. A idéia de contrários que se aproximam, de apostos contidos um no outro é que me fizeram entender o link que inventei, inadvertidamente, ligando uma história a outra. Olha só. Ao contrário de Carlos Miranda, Marcos Pontes era um herói de verdade: o primeiro astronauta brasileiro! Um currículo imbatível em qualquer concurso de títulos. Um exemplo para nossos meninos e meninas, tão pobres de sonhos. A eles, só é dado sonhar ser jogador de futebol ou modelo de uma agência internacional. Ou só isso ou só aquilo.

Marcos Pontes, ainda que meio que aos trancos e barrancos, ainda que numa história meio que mal contada, abria uma picada nova entre as desoportunidades que se engalfinham e se entrelaçam pelo caminho dessa molecada. Agora podiam sonhar de ir à lua, de viajar pela galáxia, de encontrar novos mundos, de sei lá que bobagem mais. Podiam e podiam de verdade sonhar de virar astronauta, cientista, físico, químico, matemático e toda sorte de conhecimento que esse campo inspira. Eu podia dizer: vai estudar menino, um dia você vira Marcos Pontes!

Olha em que fria estava me metendo. Não deu nem meses, e o danado do astronauta brasileiro cansou de ser herói de verdade e virou personagem de suas histórias. Tá certo que essas decisões são muito pessoais, pelo menos para nós mortais. Mas não para um herói nacional. E sei lá o que isso significa na carreira de um militar, mas, para nós civis, ir pro banco de reserva é aposentar mesmo, é dependurar as chuteiras, vestir o pijama, mudar de rumo, de assunto, de meio. Concordo com Aninha, não é tão trivial quanto querem fazer parecer.

E mais, um bolsista brasileiro que sai do país, só do país, não do planeta, para fazer fora um mestrado ou doutorado, é obrigado, na sua volta, a dedicar pelo menos dois anos a uma instituição de ensino público superior, para compensar o investimento. Nós gastamos US$ 10 milhões com a viagem de Marcos Pontes, foi mais que uma penca de pós-doutorados. Aí o sujeito vai e joga a toalha?! Como é que nós ficamos nessa? E ainda diz que vai fazer palestra na inciativa privada?! Ôw, isso é ficção ou deu na Globo? Se deu na Globo, vou apoiar Aninha na ação de restituição do dinheiro da viagem aos cofres públicos. Vou ainda ficar de olho em quem vai ter a coragem, o desplante de contratá-lo pra palestras sobre planejamento estratégico nas fiesps da vida.

Ai ai, viu. Já não se fazem mais Inspetor Carlos como antigamente. O nosso astronauta está mais pra vampiro brasileiro do que para um valoroso vigilante interplanetário. Ou não?

Boa noite e bom dia!

3 comentários:

Anônimo disse...

Patrícia,
Li sobre o astronauta e fiz um comentário no seu blog, mas perdi meu tempo, tem uma tal de senha, de cadastrar, viajei pelas janelas que iam se abrindo até eu me perder de vez. E com certeza, não consegui enviar por lá. Por isso, eu queria falar que bobagem e que besteira esse negócio de dinheiro público gasto e restituir. O erário público só vai pros ralos (deles) e agora também está indo pro espaço (aaahhahaha!!) é tudo a mesma coisa. Mas o que eu queria dizer é que você me fez viajar, como viajar, não pro espaço. Eu vi o seriado numa tv telefunken na janela da casa de um vizinho da rua que eu morava, e olha que eu era um privilegiado, morava na rua que tinha a única televisão da cidade. E fica sempre alerta depois do Repórter Esso. Ai que bom! Você me fez um bem.
beijos

patricia duarte disse...

Ei Mauro,

Que bom que te trouxe boas lembranças. Também recuperei um pedaço da minha memória com essa história (rsrsrs). Acho que o astronauta brasileiro teve esse mérito. Quanto à devolução do dinheiro, acho justo, em nome dos mestres e doutores que estão ralando nas academias brasileiras.

Anônimo disse...

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