terça-feira, abril 15, 2008

Virando o disco

Meus meninos estão mudando. Acho que estão crescendo. Agora brigam por um espaço no sofá só para assistir os jornais da noite e, quando entramos no carro, nos horários de ida e volta à escola, já toleram ouvir o noticiário em vez das enfadonhas, aborrecidas e repetitivas seqüências musicais das infinitas fms jovens que se multiplicam nas ondas do rádio. Estão mudando por livre e espontânea pressão da escola mas também pela curiosidade insaciável, própria da idade em que estão.

Não vou dizer que se impressionaram com a versão midiática da realidade, porque não seria verdade, mas estão espantados com a estreiteza de mundo que cabe dentro do noticiário. É muito pouco de quase nada e esse pouco se repete o dia inteiro, às vezes dias seguidos, semanas e até meses, sem que nada, sem que nenhuma novidade relevante tenha surgido nesse meio tempo para justificar a permanência de tal fato no noticiário.

Vou dar um exemplo: o caso Izabela Nardoni, que caiu do sexto andar de um prédio, no último dia 29 de março, e morreu. Não vou entrar no mérito do conteúdo dessa notícia, que já rendeu 18 dias de noticiário vazio. Também não vou questionar o fato deste acontecimento, um drama familiar, ter ganhado as páginas de jornais. Sabemos que a violência dentro de casa é muito mais comum do que deveria ser e precisa mesmo estar incluída na agenda pública para ser discutida por todos nós.

Mas aí é que está. Os relatos da trágica história de Izabela Nardoni não conseguem, nem a pau, escapar do particular para o coletivo e tornam-se meros reality shows, como já disse uma amiga. São relatos que não contribuem em nada para a nossa melhor compreensão da realidade. Mas isso, parece, já não interessa mais. A mídia repete a mesma história todos os dias, exaustivamente, sem nenhum elemento novo, além de meras insinuações e suposições, expondo pessoas, inocentes ou culpadas, não importa, ao nosso julgamento absolutamente desinformado e precário.

Meus meninos estão entendendo que é essa condição que produz a banalização da notícia. Ou será banalização da vida? Seja lá o que for, as conseqüências dessa distorção do noticiário são complicadas. Enquanto repete a mesma história, a mídia tem, por exemplo, uma boa desculpa para não incluir outras notícias, até de grande relevância, mas que, para a mídia, é melhor que fiquem de fora da agenda pública.

Enquanto repete trinta e seis mil vezes a mesma notícia, sem nenhuma reflexão que nos permita melhorar o nosso entendimento da realidade, a mídia nos tira a capacidade de nos indignarmos com o horror ou gravidade que essas histórias contém. Tudo torna-se normal ou inevitável, sei lá. Nada mais nos mobiliza. E amanhã, se um sujeito qualquer, por uma razão ou outra, perder a cabeça, não se sentirá inibido, por exemplo, em defenestrar o filho mais próximo para aliviar o seu sofrimento. Isso acontece - ele poderá pensar e, sem se deter mais, partirá imediatamente para a ação.

Enquanto repete outras trinta e seis mil vezes a mesma história, a mídia tenta nos convencer que esse fragmento da realidade, essa parte inacabada de uma história, é a história toda, é o todo da realidade e não sua versão construída e manipulada. E se nossa história não cabe nessa versão é porque também não cabemos nesse mundo e se não cabemos nesse mundo, devemos nos recolher a nossa insignificância e nos voltarmos apenas para o nosso mundinho particular e ali ficarmos olhando a vida pela janela, sem nos metermos em nenhuma grande confusão. Não é assim que nos querem? Meros consumidores de informação e eternamente incapazes de transformá-las em conhecimento? Esses meninos estão ficando muito espertos. Acho que a mídia não vai dar conta deles. Tomara.

Uma semana com o controle na mão, para zapear em outros mundos.

Inté.

2 comentários:

Clará disse...

Antes não estava aparecendo o link para comentar aqui. Mas ainda bem que apareceu, pq eu tenho que dizer: ESSES SÃO OS MEUS PRIMOS!!!
Tomara que quando eu tenha os meus filhos a sociedade não esteja tão deturpada que eu não consiga fazer deles pessoas boas!
Agora que história é essa de brinco e tatuagem que o Felipe me contou?

bjim

patricia duarte disse...

hehehehe...a perfeição não existe mesmo,né? Olha só a moda q eles estão querendo me inventar. Enfim é sempre uma oportunidade p/ conversarmos sobre essas coisas como moda, consumismo, e trocar idéias sobre como elas são hj.
bjins