domingo, julho 30, 2006

A idade da razão

Ôiaiá, o Lula tem cada uma. É a gente se distrair e lá vem ele de novo. Agora quer dizer, então, que precisamos esperar 75 anos para termos liberdade de falar o que nos vem à cabeça e de fazer o que nos dá na telha? Ficou doido? Com 75 anos nem sei se estarei viva. Vou esperar até lá pra quê? E taí uma coisa que Itamar e eu concordamos: ele nunca precisou esperar fazer 75 anos para ser como é. Livre, leve e solto. Parece de veneta, mas às vezes penso que não é. Sempre acho que ele tem um plano, um projeto, não pessoal, mas de mundo e se inspira nele para fazer suas escolhas. E é isso que desorienta os políticos que aí estão, que só tem projetos pessoais.

Minha avó também era assim. Ela até concordava que é, a partir de uma certa idade, que as pessoas conquistam a liberdade de falar e de fazer o que bem entendem. Mas não porque estão caducas, pelo contrário. Até uma certa idade, a gente não tem é muita noção do perigo, das conseqüências dos nossos atos. Mas, a partir de uma certo momento, que não é 75 anos e varia de pessoa pra pessoa, estamos maduros para assumir nossas opiniões, nossas escolhas. Aí, sim, estamos livres, leves e soltos para transitar no mundo sem arrependimentos. Ela adotou essa filosofia e viveu muito bem seus 105 anos.

Mas tem outra coisa que me intriga mais nessa fala do Lula. Quando ele diz que só a partir dos 75 anos temos a liberdade de falar e de fazer o que bem entendemos, ele está querendo dizer que o que fala e faz não é bem o que ele pensa nem o que gostaria de fazer? Então o que é que ele gostaria de falar e de fazer que não diz nem faz? Por quem ele fala, então? Pra quem ele faz? Quem é o dono da sua voz? Quais interesses determinam suas ações? Minha mãe argumentou que não é bem assim. Pode ser que uma pessoa só fale e faça o que pensa e deseja, mas não fala e faz tudo que pensa e deseja, porque algumas dessas coisas podem não agradar outras pessoas de quem ela gosta, porque outras coisas podem machucar essas pessoas, ou que são coisas que são erradas ou não são socialmente aceitáveis ou ainda porque não chegou o momento adequado de falar e de fazer.

Não discordo. Outro dia, por exemplo, comentávamos sobre a nossa dificuldade para lidar com essa coisa que chamamos povo. Povão mesmo. Dificuldade que o Lula, por exemplo, não tem, pois seja lá como for que ele vive hoje, é visto, por esse mesmo povão, como aquele que melhor o representa. Lula é o povo no poder. O que não quer dizer, absolutamente, que ele represente os interesses desse mesmo povo, claro, né? Nessa conversa fiada toda, um amigo, bem mais sofisticado que eu, comentou que sua relação com o homem da rua, com essa gente humilde que o Chico cantava, é muito contraditória. É de amor e ódio. Ao mesmo tempo que se sente movido, por esse amor, a fazer algo por ela, sente um ódio danado dessa mesma gente, que nos ameaça com a sua pobreza, com a sua ignorância, com suas vidas desprovidas de sentido, tornando as nossas também supérfluas e egoistas.

Ele deu o exemplo daqueles meninos que ficam trançando no meio dos carros, nos pedindo, nos oferecendo, nos intimidando, nos ameaçando, nos matando. Ele sente amor por esses meninos, a ponto de querer e de fazer algo por eles. E sente ódio também, sente vontade de ameaçá-los da mesma forma, de matá-los com as mesmas armas. Porque, como eles, estamos todos perdidos no mesmo caos, sem saída. Mas não faz isso, é óbvio. Esse é um exemplo de que, mesmo sendo livre, leve e solto para dizer o que pensa e fazer o que quer, meu amigo não diz nem faz tudo que passa pela sua cabeça.

Mas essa é outra história. O que eu fico pensando é que quando um político, eleito para representar uma parcela da população, para defender um projeto de mundo, um idéia, uma política; quando esse político não se sente a vontade para dizer tudo o que pensa e fazer tudo que acha que tem de ser feito, é estranho. É muito esquisito. Tem uma coisa errada aí. Ou ele não é exatamente o melhor representante daqueles a quem ele diz representar ou ele está fingindo representar um grupo que, de fato, não representa, ou está apenas representando seus próprios interesses. Ou tudo isso junto.

O maior dom de um político é a palavra, é o poder de poder dizer, o poder de poder começar a fazer pelo menos. Se não é, o que é, então? Vai esperar fazer 75 anos? Então, um dos critérios que vou adotar nessas próximas eleições, será o da idade. Só voto em quem tiver mais de 75 anos de idade. Pronto.

Para vocês, com menos de 75, a minha mais plena e completa desconfiança.

Uma semana livre, leve e solta para todos.

Até mais não ver.

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