Belo Horizonte, 09 de maio de 2006
Meninas e prezadíssimos,
Também vou escrever uma carta. Não posso perder essa oportunidade, de praticar a velha arte epistolar. Esses fenômenos revival ressurgem do nada e desaparecem da mesma forma e rapidinho. Passam como um vento, uma brisa que sopra, espanam um pouco a poeira e vão embora de novo. No sábado, é possível que já tenha passado. Os seres humanos são assim mesmo, muito estranhos. Olha só, além das cartas, também virou moda de novo os álbuns de figurinha. Pela madrugada (rs), isso é muito antigo! Mas a proximidade da Copa fez reviver essa mania. E não é que ainda funciona muito bem? Os meninos ficam loucos atrás de mais figurinhas e mais e mais, até caírem no golpe das avis raras. Essas são disputadas mesmo é no velho e bom tapão.
As cartas já são bem mais antigas, mas também deveriam funcionar. Só que não estão. No início do mês de abril, Lula enviou uma carta ao presidente da Bolívia, comentando diversos assuntos que deveriam compôr uma pauta de negociação entre os dois países. Isso foi bem antes de Evo Morales também embarcar noutra onda revival, tirando do fundo do baú a sua versão das reformas de base, requentando, como andam dizendo por aí, o velho mexidão populista-nacionalista. O Lula tentou, mas Evo não respondeu. Nem sei se leu a carta.
Os iranianos entraram de cabeça nessa onda. Aderiram, sem restrições, à mania revival. Parece até que estão fazendo uma corrente. No curto espaço de oito dias, já enviaram três cartas. A primeira foi assinada pelo embaixador do Irã na ONU, Mohammad Javad Zarid, e destinada ao secretário-geral da organização, Kofi Annan. A carta foi postada no dia 1°. de maio e denunciava as ameaças de bush contra o seu país. Não teve muita repercussão. A segunda, despachada seis dias depois, foi assinada pelo Parlamento iraniano e também remetida a Kofi Annan. Na carta, lida até na rádio oficial iraniana, os parlamentares comunicavam a intenção do país de se retirar do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, caso o Conselho de Segurança da ONU não encontre uma solução pacífica para essa encrenca toda que aí está. Não sei se Kofi Annan respondeu e nem se a carta vai surtir efeito. Por enquanto, temos de aguardar.
A última, despachada na segunda-feira, foi assinada pelo próprio presidente, Mahmoud Ahmadinejad, e destinada ao presidente americano, aquele que não vai assinar o Protocolo não sei de quê. Há controvérsias, mas dizem que esta foi a primeira carta escrita por um presidente iraniano ao presidente dos Estados Unidos, desde a Revolução Islâmica, em 1979. Ahmadinejad apresentou na sua missiva novas soluções para acabar com os problemas internacionais e a frágil situação do mundo. Essa teve uma boa repercussão, só que ninguém sabe o que o presidente iraniano está sugerindo para resolver todos os nossos problemas. Desconfio que tem a ver com a vaga na Casa Branca, porque bush nem triscou e mal terminou de ler, guardou a danadinha debaixo do travesseiro. Ele bem que podia quebrar o nosso galho e deixar um jornal desses aí publicá-la, não é não? Tá todo mundo curioso, pomba!
Ah, já estava até me esquecendo. O Suplicy também andou postando carta nos últimos dias. O senador enviou uma ao presidente Lula sugerindo a ele tomar a iniciativa de marcar uma visita ao Congresso Nacional para fazer uma exposição sobre as revelações divulgadas por Sílvio Pereira, em entrevista ao O Globo. Em outras palavras, ir ao Congresso para se explicar. O Planalto protocolou a carta, que agora deve estar tramitando de sala em sala no Palácio. Nesse compasso, antes mesmo de Lula ter a chance de abrí-la, a carta já virou chacota. Até o Herótodo, que é tão discreto, não conseguiu segurar o riso e quase teve de interromper a entrevista que fazia! Olha só, achei até um pouco desumano e fico pensando que sua intenção foi também a de desqualificar o meio utilizado pelo senador. Acho que cartas, se bem redigidas, ainda podem funcionar. Bom, mas essa, acho que vai ser difícil.
E foi só me distrair, tentando escrever essas mal traçadas linhas, e olha só, o Lula já soltou mais uma carta. Essa foi dirigida à presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Mas o Lula já está avacalhando, enviou a carta via fax, vê se pode? Bom, são os novos tempos. Na carta, Lula falou da crise política, das angústias e das dores que vem sentindo e reafirmou o compromisso do seu governo com os pobres. Também não sei se vai funcionar. Os padres estão aborrecidos de verdade com o presidente.
E isso tudo sem falar da carta do Garotinho, enviada à Organização dos Estados Americanos (OEA). Num tô dizendo que virou uma mania. Na carta, o Garotinho relata a perseguição política de que tem sido vítima e outras coisas que não me lembro. Ai, ai, menino, quando dá de escrever carta, é uma imaginação sem limites. Conheço bem desse babado. Não sei se essa carta vai funcionar, mas provocou mais uma corrente sem fim de cartas. Umas apoiando o ex-governador do Rio, outras criticando, outras descendo o pau, algumas enviadas pelo correio, outras pelo fax, outras por e-mail e tem até carta que não sei se foi enviada, mas foi lida no rádio. Enfim, é isso, a arte epistolar está de volta. Aproveitem!
Mas para desfrutarem bem dessa moda, é preciso relembrar alguns conselhos básicos dos grandes missivistas. Tenho um texto de Erasmo de Rotterdam que é a bíblia: Brevíssima e Muito Resumida Fórmula de Elaboração Epistolar. Só para dar vontade, vou citar um trechinho pra vocês. Lá vai:
"...o estilo epistolar deve ser simples e mesmo bastante descuidado, no sentido de um descuido estudado....em primeiro lugar, deve-se fugir das palavras artificiais, antigas, excessivamente afetadas e repetidas".
Se tiver tempo, paciência e a mania não tiver passado, volto ao tema numa próxima carta.
Lembranças aos familiares.
Bons sonhos, belas cartas, boas notícias e um alegre despertar para todos!
4 comentários:
O Lula sabe escrever???
Uai! Postei uma resposta aqui e ela sumiu. Acho que minha cartinha se extraviou.
Vou me repetir:
Huahuahuahua! Então é você, hem Marisa? Não sabia que Lula tinha um ghost write. Beleza. Então, menina, mãos à obra. Vou te dar uma dica para melhor a performance social de suas missivas. Leia o texto de Erasmo e também do Anônimo de Bologna e Cícero. Todos três têm orientações muito boas sobre como escrever uma carta e obter sucesso nos negócios. Ou como escrever uma carta e ter respondidos os seus pleitos. Ou ainda, como escrever uma carta e obter resposta. Hehehe.
Não li todos eles, mas recomendo, pois são clássicos, né?
[]s e recomendações ao digníssimo.
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