Desisto. Vou envelhecer como deus quer. Outro dia, resolvi enfrentar os sinais do tempo, apelando para os avanços da farmacologia moderna. Comprei dois cremes fantásticos, último lançamento da linha de neurocosméticos. A vendedora, uma entendida, me garantiu que os produtos eram dermatologicamente testados e que eu ficaria impressionada com os resultados.
Francamente, acho difícil me impressionar com isso. Primeiro, porque sempre que me olho no espelho tiro os óculos e aí só me vejo muito vagamente. Não me enxergando em detalhes, acho pouco provável que me encontre em condições de avaliar o resultado dessas poções milagrosas. Depois, porque as coisas que me impressionam genuinamente são de outra grandeza. Fico estarrecida é com as manchetes de jornais, com as histórias de vida que capto no ar, com as gracinhas dos meus meninos e assim por diante.
Claro, não vou dizer que uma ruga a mais ou uma ruga a menos não mexa com o meu humor. Tem dias que saio de casa mais satisfeita com o que não vi no meu rosto. E tem dias que saio de mal com o mundo, ainda que conformada e passiva diante do poder imbatível do tempo. Mas tem dias também que fico pensando no que vem primeiro: se a mudança de humor ou se as rugas que querem redesenhar meu rosto. É uma dúvida e trago-a sempre comigo como um conforto para os dias que virão.
Mas comprei os cremes. Os potinhos são maravilhosos, parecem duas caixinhas de jóia e eu amo caixinhas. Mesmo vazias. Em casa, tirei-os logo da embalagem e deixei os dois potinhos bem à vista, na bancada do banheiro, para não me esquecer de usá-los assim que fosse possível. Nisso, foram dois ou três dias, até que finalmente me animei a experimentá-los. Vai que funcionem bem.
Primeiro, lavei o rosto com um sabonete especial. Pois é. Tive de comprá-lo também. Já disse que a vendedora é uma especialista, não disse? E ela me explicou que é assim que devo fazer. Primeiro lavar o rosto com esse sabonete, depois enxugá-lo com uma toalha branca e bem macia e, só então, passar os cremes. Em movimentos circulares de baixo para cima. Parece até simpatia, mas segui todas as recomendações.
Não precisei de mais de uma sessão vaidade para ver que isso não ia dar certo. No dia seguinte, acordei com os olhos coçando, depois o rosto, depois o pescoço e depois os braços e, antes do meio dia, já tinha certeza absoluta de que o que estava sentindo era uma reação alérgica aos cremes dermatologicamente testados e da última geração dos neurocosméticos. Claro.
Tem dias que fico impressionada é com a minha teimosia. Já passei por essa mesma situação umas quinhentas vezes: quando quis usar um esmalte cor de vinho, de marca comercial, que vinha numa embalagem fascinante, de vidro opaco com tampa de aço escovado; quando quis passar um batom rosa choque com ingredientes naturais; um brilho labial importado, que uma amiga me deu de presente; um protetor solar fator 30 não oleoso; perfumes das mais variadas fragrâncias e assim por diante. Tudo me dá alergia. Por isso só compro cosméticos numa farmácia de manipulação, vendidos em embalagens de remédio. Não têm o menor charme.
Por isso também, desisto. Vou envelhecer do jeito que deus quer, mas com bastante discrição, igual D. Mariza, não a do Lula, mas a do vice José Alencar. Vou envelhecer sem adjetivos, fazer o quê? Agora, cá pra nós, maldita lei da gravidade! No Brasil temos tantas leis que não pegam, precisava ser justamente essa para colar assim com tanta ênfase? Meninas, deveríamos fazer um movimento, uma campanha com abaixo-assinado e blog na internet, para exigir dos nossos parlamentares a revogação de pelo menos alguns dos artigos dessa lei. E aí, topam?
Uma noite sem fantasias nem maquiagens nem ilusões. Mas que seja bem estrelada para continuar iluminando nossos sonhos.
Até de repente outra vez.
5 comentários:
Pois é, amiga, já passei por isso algumas vezes. Por quê que a gente insiste? Mas seu grande interesse foi pelos potinhos e então a compra não foi em vão. Basta raspar o creme dos potes e colocar outro creme ou outra coisa como gominhas para o cabelo, brinquinhos, hipoglós, tictac, grampos, aneis, gotas de chocolate... Como diria o Rei: são tantas cosinhas miúdas... Por favor não mexa com a lei da gravidade. Já estão desviando o São Francisco, tirando os caroços das frutas e tantas outras esquisitisses, se revogarem a lei da gravidade, te juro, eu pulo fora.
A gravidade é a força que nos puxa para baixo" – Merlin, no filme da Disney A Espada Era A Lei(filme)
Realmente, amiga, a revogação de alguns dos artigos da lei da gravidade trariam alguns transtornos para o nosso dia a dia,mas ainda assim, acho que deveríamos tentar. Pense bem, não seria de todo mal flutuarmos ao invés de corrermos o dia inteiro, hem? Mas concordo, devemos pensar melhor antes de chegarmos a propor qualquer coisa ao Parlamento. Vc sabe, a política é a arte de tornar possível tudo aquilo que antes nos parecia impossível. É regida por outra lei, a da improbabilidade e suas exceções. Aí vai que a gente se precipite e alguém lá tope nos representar, né? Muito sensata a sua observação.
muito bom! ahhahaha
eu ainda sou muito² nova,
não tenho tantos problemas
com a gravidade hahaha
mas tô dentro do b. assinado :D
:*
Estou logo atrás...onde eu assino? hahaha
ps:Tá td lindo Patricia, as palavras, a forma cm dão sentido aos textos, gostei, de verdade!
Beijos...dia desses volto pra mais um cafezinho! :)
Como seu texto é sensível!!!! fala bem da difícil arte de envelhecer!!! Sim, envelhecer é uma arte, poucos conseguem isso com plenitude!!!
Obrigada pelas doces palavras no meu blog!!!!
Bjos e adoro seu café!
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