quinta-feira, novembro 23, 2006

Conversa fiada

Trilha alternativa: Within You, Without You, com eles, os Beatles

Eu entendo o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Também acho que têm conversas que é melhor não tê-las. Não que nunca, mas talvez só no momento certo. Têm conversas que são até boas, mas mesmo assim, não convém. Outras, nem tanto. Melhor evitá-las. E dos pescopapos, temos de fugir deles. Passo léguas de distância.

Têm conversas que é melhor mesmo não tê-las, porque não levam a nada. Vocês já tentaram conversar com um adolescente em crise? É bobagem puríssima. Não adianta falar que ele é lindo, forte, inteligente, engraçado, que todo mundo é doido com ele, que a vida é bela, que tudo passa, que em terra firme nada é definitivo, que o céu é azul e que o melhor de tudo é que depois de um dia, vem outro dia. Besteira.

Adolescente em crise acha que o mundo desabou, que o chão escapou, que o abismo é fundo e que no fundo do fundo tem outro fundo que não tem fundo. Nessas horas, melhor do que conversar é fazer um brigadeiro bem cremoso e deixar encima da mesa, assim meio que esquecido. É deixar o cd, que ele adora, tocando no som e ainda comentar, distraidamente, que essa é a música. É assistir, ao lado dele, bem agarradinha, o último jogo de futebol de não sei quem contra quem e comentar furiosamente todas as bobagens que o juiz fizer. Só isso e não mais que isso, pois todo o resto é em vão.

Só quando tudo passa, o tudo que não é nada, é que dá pra voltar a conversar. Aí vale o que vier. Vale até conversa afiada. E, melhor que isso, bem melhor, depois que o tudo passa, é jogar conversa fora. Parece que também não levam a nada, mas é ledo engano. Dois dedos de prosa sobre nada e, de repente, percebemos que já não vemos mais o mundo como o víamos antes. São palavras ao vento, mas no bom sentido, pois são capazes até de mudar o rumo de uma história. Mas hoje são raras. Ninguém gasta tempo com conversa fiada, um assunto puxando outro, um caso emendando em mais um e outro mais, como se tecêssemos uma grande história. Nem rola. Ninguém mais joga conversa fora.

Fernando Henrique não joga e eu entendo. Pode até falar sozinho, falar até pelos cotovelos, atabalhoadamente. Mas se é uma conversa, é preciso dois. No mínimo. É preciso então saber quem está a conversar com quem. Cada um tem que ser cada um. E aí é que está. Qual PSDB vai conversar com Lula? Qual Lula vai se apresentar? E onde vão conversar? Atrás de portas fechadas? A luz de velas acesas? Outra vez Fernando Henrique tem razão. É melhor conversar com o povo, de quem se distanciaram tanto, se é que já estiveram próximos um dia. É melhor conversar à luz do sol, no meio da rua, sob os holofotes do Plenário. Um de frente pro outro, um olhando olho no olho do outro. E mais, se é mesmo pra conversar, tem que ter o que conversar. De abobrinha, basta a que já nos fartamos durante as eleições, não é não?

Um restinho de semana com muita conversa fiada no ar.

Até mais ver

Nenhum comentário: