quarta-feira, junho 04, 2008

Do alto de um muro bem alto

Benedito Valadares, à direita de Juscelino


Reza a lenda que o movimento separatista do Triângulo Mineiro foi definitivamente desacreditado em 1934, quando era governador de Minas Benedito Valadares. Diante da pressão crescente dos prefeitos da região e em meio a manifestações que reuniam mais de 5 mil pessoas na praça da pequena Uberaba, o governador enviou, por meio de um amigo, um recado curto e grosso aos insurgentes:

- Não seja por isso. Diga a eles que Minas adere!

Estou desconfiada que Evo Morales não terá outra saída. Mais cedo ou mais tarde, será forçado a repetir o mesmo gesto de Benedito Valadares e, antes que a Bolívia se dissolva num mar de intrigas, anunciará sua adesão ao movimento separatista dos governadores de oposição. Liderando as regiões mais ricas do país, esses governadores obtiveram vitórias importantes nos referendos realizados em Santa Cruz, Beni e Pando e estão conquistando o apoio popular à opção pela autonomia. Evo tem minimizado esses resultados, alegando que as abstenções são muito altas também. E é verdade, mas não anula o resultado positivo dos referendos. Por isso fico pensando que Evo não terá como escapar, a não ser aderindo ao movimento.

Hillary, por exemplo, já pensa nessa possibilidade. A história é outra, mas a situação é a mesma. Ou não?

E, guardadas as devidas proporções, até nós corremos o risco de ter de assistir a mais uma versão dessa lenda. Se não ficar esperto, o PT vai acabar atropelado em plena Praça Sete. Antes de ter de se render aos fatos, melhor seria aderir a eles, como fez Benedito Valadares. Até mesmo sem conhecer as entranhas dessa história, pois essas são inalcansáveis e só compreensíveis no contexto da política mineira. Eu, particularmente, não sou contra nem a favor, muito antes pelo contrário, mas reconheço: a proposta de se formar uma aliança entre PT e PSDB para disputar as eleições de outubro próximo já é fato consumado em Belo Horizonte. As letras poderão até mudar de lugar, mas a essência da proposta não mudará e nem seus personagens. Só um acidente de percurso, da ordem dos furacões e terremotos, poderá desestabilizar essa dobradinha. O risco sempre existe, pois política é como nuvens e o humor dos eleitores muda sem aviso prévio, mas os astros, parece, vão torcer a favor.
Lula e FHC, nos velhos tempos

Historicamente, os dois partidos têm uma trajetória que muito mais os aproxima do que distancia, haja vista os governos de Fernando Henrique Cardoso e Lula. A própria biografia de seus quadros reforça essa leitura. Apesar das diferenças, FHC, Lula, Serra e assim por diante são muito mais dessemelhantes do que adversários. Tomaram caminhos diferentes, fizeram escolhas que os distanciaram , mas nada que a história não possa juntar de novo. E visto desta maneira, parece mais inverossímil as alianças do PT com o PMDB e outros Ps do que com o PSDB. E, da mesma forma, do PSDB com o DEM, com o PMDB de Quércia e outras variações em torno do mesmo tema. A proposta de Belo Horizonte não é, portanto, uma proposta de todo estapafúrdia, como querem fazer parecer.

Fora tudo isso, resta ainda e sempre uma terceira via, radical, pra direita ou pra esquerda, ao gosto do freguês. Como não estou com pressa, vou fazer como Benedito, esperar pra ver como é que fica.

Uma semana olhando o mundo de cima de um muro bem alto, mais alto que o mais alto de todos os muros do mundo
Inté
Fotos: pescadas na internet. Os links, acredito, estão nas fotos.

3 comentários:

Anônimo disse...

Patricia,

Que bela análise! Vou fazer apenas pequenos comentários, começando do fim.

De fato, o PT e o PSDB tem muito em comum, aliás, não fosse no Brasil, seriam aliados sempre. A disputa entre ambos trata-se de poder, por que na política as propostas são as mesmas.

Evo Morales está em uma situação bem difícil. Particularmente, eu acho que a oposição está jogando sujo. O presidente, em que pese a sua péssima administração, acertou em alguns pontos, como por exemplo, propor a descentralização. Mas claro que a mídia pouco lembra deste fato, pois foi ele quem primeiro levou esta proposta.

Só que como a oposição se nega a ao menos sentar na mesma mesa para discutir, tomaram estes movimentos como uma idéia legítima, o que na verdade nunca foi.

Da mesma forma que na Venezuela, na Bolívia se recusam a sentar com índios para discutir qualquer coisa. Ou seja, mais vale o velho estilo arrogante que pensar em democracia, mas não hesitarão em usar estas palavras para promover movimentos separatistas.

Beijos!!!

Anônimo disse...

Gostaria de discordar. A ala mais à direita do PT chamada Articulação, a do Lula, se afina com o PSDB, porém as outras não. Então eu acho que a Articulação deveria se filiar ao PSDB e dar sossego ao PT.
Mas quanto à foto do lado, Patrícia, você já está tecendo uma fina renda de paisagens urbanas. E nós agradecemos.

patricia duarte disse...

Pois é Márcio, não tenho dúvidas de que Evo está numa situação bem difícil. Apesar de estar no alto de um muro bem alto, outro dia li na FSP uma entrevista de alguém do governo de Evo (já me esqueci quem) que dizia dos interesses que estavam por trás do movimento dos governadores de oposição e, claro, entre eles, estava a terra, a proteção dos latifundíos, entre outros. Então é uma briga pesada mesmo. Mas alguém terá de ceder uma hora e sentar pra conversar, se não quiserem ver a Bolívia chafurdando na história mais uma vez.

Oi Ana Márcia,
Eu vou deixar você discordar (rsrsrs)pois já sabia que você discordaria mesmo. Mas, ainda assim, continuo achando que a ala mais a esquerda do PT também tem a ver com o PSDB. E vice-versa. Não estou dizendo que todos pensem iguais. Se pensassem estavam todos no mesmo partido. Mas pensam próximos e isso é suficiente para possibilitar uma aliança. Isso se quisermos avançar e não ficar chafurdando também. Política é isso,entre outras coisas. É a arte de tornar o que parece impossível em alguma coisa possível e assim um dia após o outro, fazendo-nos avançar em direção a algum lugar lá na frente, lugar que pode ser também a nossa utopia. Eu acho.

Brigadinha pelo incentivo. Um dia ainda vou me dedicar só a fotografia (rsrsrsrs).
bjins.