segunda-feira, outubro 01, 2007

Tá na hora

Foto: Tirada no dia 29 de setembro de 2007!
(Minha)

Meninas, olhem quem eu vi na rua ontem! Vocês reconhecem? De duas, uma. Ou perdi alguma coisa ou a turma pirou na batatinha. Fiquei tão desorientada quando o vi ali, sentadinho no telhado de um sobrado da Contorno, que vasculhei desesperadamente minha agenda, para conferir se não estaria atrasada alguns dias no meu calendário. Tive semanas bastante tumultuadas nos últimos tempos e seria muito razoável se isso tivesse acontecido. Mas não, o tempo não rolou ladeira abaixo. Como em todos os anos anteriores, continuamos no início de outubro Nem passamos pela semana da criança. Sobrou, então, só a segunda opção.

E não é de hoje mesmo que estou percebendo a fúria gananciosa dessa turma. Daqui a pouco vão fazer igual a um amigo do meu menino, já não mais tão menino assim. Eles participam de um fórum na internet e, quando chega a época do natal, sempre disputam quem primeiro vai customizar o seu avatar com um chapeuzinho vermelho de Papai Noel. Aliás, disputavam, pois, desde 2005, um dos membros do grupo adotou o avatar do natal e assinou embaixo: Coelho Morto - Desde 2005 com o chapéu de Papai Noel. Acabou a polêmica.

De uma certa forma, na vida real, também já superamos essa polêmica. Essa turma nos mobiliza o ano inteiro, independentemente de datas especiais. Segundo pesquisas divulgadas não me lembro onde, estamos submetidos a mais de 3 mil apelos publicitários por dia, desde a hora em que acordamos até a hora em que nos deitamos. Nos pedem para comprar qualquer coisa, de preferência, tudo: de alfinetes com cabeça colorida até coberturas duplex com vista definitiva para a mata preservada de não sei onde. E não contentes em nos vender produtos, agora nos oferecem descaradamente até sentimentos: felicidade, alegria, amor podem ser adquiridos em suaves prestações até no mercadinho da esquina.

As mensagem nos cercam de todos os lados. Transitam dos outdoors e empenas espalhadas pela cidade, para os anúncios convencionais, multiplicados em jornais, revistas, rádios e tevês. E se passamos ilesos, não mais. No primeiro sinal vermelho, nos entregam, em mãos, três ou quatro flyers coloridos, propagandeando qualquer besteira. Se driblamos o sinal, nos enviam pelo correio. São quase 20 malas diretas por semana, que invariavelmente jogamos no lixo, mas não sem antes matarmos a nossa curiosidade. Sempre lemos uma ou outra. Se estão com pressa, não fazem cerimônia, invadem a nossa caixa postal eletrônica como se estivessem em casa. Milhares, cruzando os oceanos em pouco minutos. Algumas caem no nosso correio. Muitas nem abrimos, mas sempre fica uma ou outra para contabilizarmos na nossa estatística: 1.876, 1.877, 1.878....

E não adianta fugir. As mensagens nos perseguem pela cidade, cruzando nosso caminho a toda hora, indiferentes ao trajeto que escolhemos: estão estampadas na janela dos ônibus, na porta de carros, nos postes, em faixas atravessadas nas ruas e em tabuletas carregadas por pobres famintos, que ficam zanzando de um lado para outro nas calçadas abarrotadas do centro. E se fechamos os olhos para não vê-las mais, um carro de som nos encontra na primeira esquina. E se tentamos nos abrigar num prédio mais próximo, logo na porta trombamos com um banner gigantesco e colorido, nos convidando para mais uma nova aquisição. Isso, para não falarmos de outras formas mais sutis de propaganda, travestidas de personagens de novelas, embutidas na etiqueta da roupa que vestimos, na embalagem dos produtos que já consumimos e assim ad infinitum. 2.998, 2.999, 3.000!

Mas, desse encontro inesperado com o velhinho, o que achei mais louco foi perceber que o mundo não gira para essa turma. Entra natal, sai natal e eles não caem na real. A Terra está desabando a nossa volta e essa turma não dá nem notícia. Mas os distraídos serão surpreendidos nessa próxima década. Isso é certo. Eles e bush, aquele que jamais terá oportunidade de assinar o Tratado de Kioto. Agora agiremos por conta própria. Não fui ver Peter Senge, mas me contaram tudo. E ele disse com todas as letras, repetindo o que os grandes empresários do mundo todo já disseram a ele, com todas as letras: não temos mais alternativa. Foi isso o que Peter Senge afirmou: ou mudamos o nosso padrão de consumo ou mudamos o nosso padrão de consumo.

Não é porque somos bonzinhos que faremos isso, nem porque somos ecologicamente corretos, mas porque não temos outra opção mesmo. O planeta não consegue mais repor seus recursos naturais na mesma proporção em que os consumimos. E as mudanças climáticas tornarão essa dificuldade mais grave ainda, principalmente no que se refere aos alimentos. Disso já sabemos. O que ainda não admitimos é que os anos de prosperidade estão chegando ao fim. A crise financeira, que está sendo cozinhada em banho-maria pelos bancos centrais, é apenas uma primeira fumaça bem longe no horizonte. Mas já podemos enxergar outros sinais.

Na semana passada, ouvi no rádio economistas de várias matizes explicando a origem da pressão inflacionária que já ameaça o mundo e, ainda que de leve, o nosso próprio Real. Não, dessa vez a culpa não é do Lula. A pressão vem de fora, provocada justamente por um desequilíbrio entre oferta e demanda de determinados produtos, como o leite, a carne bovina, o trigo e o milho. A origem desse desequilíbrio são as mudanças climáticas, que afetaram a produção dessas culturas e o bom desempenho dos empreendimentos agropecuários. Como as mudanças vão continuar e num ritmo acelerado, tornando mais instável ainda a relação entre oferta e demanda, o risco de enfrentarmos uma grave crise inflacionária, de âmbito planetário, não está fora da agenda.

Mas não é só isso. A pressão sobre os preços aumenta também em função da entrada no mercado de novas levas de consumidores, tanto dos países emergentes, quanto da China. E será impossível garantir a inclusão desses novos segmentos, mantendo-se o mesmo padrão de consumo que o mundo tem praticado, principalmente, a parte mais desenvolvida dele. Desconfio que essa seja a maior preocupação que ocupa o coração e a mente dos grandes empresários, amigos de Peter Senge. É o nó que querem desatar. Mas será impossível desfazê-lo, se não estivermos dispostos a mudarmos o nosso padrão de consumo para um modelo novo e sustentável.

Por isso achei extemporânea essa visão antecipada de Papai Noel. Já estamos atrasados para fazer as mudanças que se fazem necessárias e essa turma ainda nem percebeu que terão de rever também seus negócios e o próprio espírito que os inspira nas grandes datas. Ai, ai, viu?



Uma semaninha bem comportada para todos. Assim, Papai Noel poderá nos trazer boas idéias de presente de natal. Precisaremos delas, bem antes do que imaginávamos.
Inté.

7 comentários:

Anônimo disse...

Muito massa a imagem "Espelho engarrafado"
Perfeita!!!

Anônimo disse...

Nossa, nem acredito que em setembro já estão fazendo este tipo de marketing. Não acredito que sejam táticas inteligentes.

Beijos!!!

Simples de coração disse...

Belo texto...belo blog. :))
www.ivansc.weblogger.com.br

patricia duarte disse...

Pra vocês verem. Estão disputando quem primeiro começará a campanha de natal e atropelaram o dia da criança. Pra mim, tanto melhor. Já avisei aos meninos: esse ano vamos pular uma fase, vamos direto pro natal e estamos conversados. rsrsrs.
Obrigada todos pela visita. Voltem sempre.

Anônimo disse...

olá...te mandei um e-mail com comentários sobre o diálogo lá no blog...
depois dê uma olhada.
yuri

Anônimo disse...

Patrícia minha mente ainda está pensando nisso desde o setembro do ano passado, quando vi uma dessas atrocidades publicitárias aqui em minha cidade! E agora me deparo com as tuas mais que perfeitas colocações... e fatalmente me pergunto: Onde vamos parar??!! Será que as pessoas não percebem que não há mais opções? que a única opção é a consciência!! E uma Consciência completa não essa pseudo-conscientização de discurso que temos visto por ai!!!
Báh eu adoro o teu blog!!! É um blog pulsante, pensante e instigante!!!
Abraços

Unknown disse...

Eu só estou esperando passar o dia das crianças para armar a minha árvore. Mas propaganda de natal em setembro é de matar, né? Ah, adorei o blog, achei no Pimenta.