Agora os americanos ficaram nervosos de verdade! E quando os americanos ficam nervosos, eles ficam muuuito bravos. Nós, nem tanto. Aliás, raramente. Mas os americanos têm essa facilidade, quando ficam nervosos, ficam imediatamente bravos. Acho que é porque são cientes de seus direitos e, por isso, não duvidam de que estão com a razão. Tudo bem, que seja: porque são ávidos consumidores e acreditam piamente na máxima de que o cliente tem sempre razão. O fato é, que tendo a razão ao seu lado, quando se sentem injustiçados ou tripudiados ou enganados ou vilipendiados, ficam nervosos e imediatamente bravos. Tomados por esse espírito indomável, vão à luta, e aí, que se cuidem todos os demais.
Sábado, mais de 50 mil americanos, agasalhados até o pescoço, foram às ruas para protestar contra a guerra do Iraque. Cá pra nós, é muita gente! Para mim, é até muito mais do que muita, considerando o frio que estava fazendo lá. Só estando muito bravo mesmo para cometer essa insanidade, não é não? E 50 mil, venhamos e convenhamos, qualquer criança sabe disso, é muito mais que 2 mil, - o total de ex-combatentes e ainda partidários da guerra que também foram às ruas, defender a permanência dos americanos no Iraque.
E 2 mil é menos ainda, porque, além dos 50 mil americanos que protestaram em Washington, houve manifestações em várias outras cidades americanas, inclusive hoje, e em vários outros países, como Bélgica, Malásia, Japão, Espanha, França,Turquia e Grécia. Não tive notícias de protestos no Brasil, mas eu entendo. Primeiro, não temos a mesma facilidade dos americanos para ficarmos bravos e, depois, estamos muito ocupados com a nossa guerra particular. Ainda não ficamos bravo o suficiente para irmos às ruas. Levamos mais algum tempo para isso. Mas já estamos reagindo bem. Ontem, no Rio de Janeiro, palco da nossa guerra civil, foram fixadas 700 cruzes na praia de Copacabana, representando cada uma das vítimas da violência naquela cidade, desde o início de janeiro. Isso é um começo, não é não?
Mas voltando aos americanos, eles estão começando a ficar também impacientes com bush, aquele que não precisa mais assinar o Tratado de Kioto, pois teremos coisa melhor pela frente. Eles estão perdendo a confiança em bush, sabe como é? Isso é a pior coisa que pode acontecer a qualquer pessoa. O que dirá a um presidente! E a última vez que os americanos perderam a paciência com um presidente, eles o mandaram de volta para casa mais cedo. Lembra do Nixon? E a última vez que os americanos ficaram bravos com um presidente belicoso, o mesmo Nixon, por coincidência, ele teve de chamar a tropa de volta para casa mais cedo, antes do final da guerra, ou melhor, antes de vencerem a guerra, se é que alguém acreditava que isso ainda era possível naquela época. Assim como hoje, né? No Vietnan, como no Iraque.
Eu vi. Finalmente eu vi, neste domingo, dia 18 de março de 2007, alguém em Washington, segurando um cartaz, pedindo o
impeachment de bush. Estão ficando impacientes, não disse? Mais do que isso, eu li, numa das infinitas páginas da internet, a notícia de que o procurador-geral do Tribunal Penal Internacional, Luiz Moreno Ocampo, um argentino, reconhecer, ainda que hipoteticamente, a possibilidade de um dia o primeiro-ministro do Reino Unido, Tony Blair e o presidente dos Estados Unidos, bush, serem processados pelos crimes cometidos no Iraque. Não estou dizendo? Está pintando um clima nessa novela.
E não são apenas os americanos e o mundo que estão ficando cheios dessa guerra não. Os próprios iraquianos estão por um triz e com muito mais razão. Nove em cada 10 deles dizem viver sob o domínio do medo. Temem, sabiamente, que a violência da guerra, mais dia menos dia, alcance a eles ou às pessoas com quem convivem muito proximamente. Respondendo à mesma pesquisa, realizada pelo jornal USA Today, pela rede de televisão ABC, pela BBC de Londres e pela rede de TV alemã ARD, 82% confirmaram não confiar nas tropas de coalizão, e mais de dois terços, disseram preferir a proteção das próprias forças de segurança iraquiana. Isso é um sinal de exaustão. Será que bush vai entender?
Segunda-feira, quando chegar à Casa Branca, bush terá nas mãos uma ótima justificativa para retirar as tropas americanas do Iraque. Não terá outra oportunidade como essa. Não encontrará outra saída mais honrosa do que essa: o desejo do povo americano. Vai? Mas será que bush vai entender isso? Será que a indústria armamentista americana e suas subsidiárias pelo resto do mundo terão ouvidos para captar esses sinais?
E, voltando à nossa guerra civil particular, será que vamos aprender a ficar bravos também, a subir nas tamancas e a rodar a baiana? Será que vamos dar sinais da nossa exaustão diante das estatísticas, cada vez mais gordas, da violência não só no Rio, mas em todas as grandes cidades do país? Será que vamos ser capaz de nos mobilizarmos para, juntos, buscarmos saídas mais consistentes da barbárie em que nos metemos?
Será? Será? Será?
Uma semana de suspenses pela frente.....
Mas que seja plena de luz e paz para todos e sempre.
Inté.
PS: Ia me esquecendo:
Trilha alternativa: Tá com medo?, de Arnaldo Antunes. Não é a que gostaria, preferia Da aurora ao luar, mas é a que está sendo possível hoje.