quinta-feira, março 29, 2007

E se

Foto: minha. Do ser arbóreo que mora na minha calçada

Fico com uma pena danada de não termos mais as quatro estações do ano como sempre tivemos. Se tivéssemos, hoje estaríamos tirando do maleiro os nossos twin-set de cores variadas, para enfrentarmos as tardes mais friinhas do outono. Se tivéssemos, era hora de escovarmos nossas botas de cano curto, pois fatalmente estaríamos precisando delas para nos proteger da friagem nos pés. É gripe na certa, concordam? Se tivéssemos, teríamos de correr para fechar as janelas antes do anoitecer, pois o vento encanado é outra receita infalível para gripes com os mais variados sintomas.

Se ainda tivéssemos as quatro estações do ano, pegaria um livro do Manoel de Barros, a manta azul que uma vez ganhei de presente de aniversário e me deitaria no sofá da sala para ler poesias. Se ainda tivéssemos, abriria uma barra de chocolate da Lindt e a devoraria inteira, para não deixar rastros. Ou então, em vez de coca-cola com gelo e limão, faria um chá de damasco, daquele que comprei numa loja do shopping Eldorado, uma vez que fui em São Paulo. Mas isso foi há muito tempo, quando ainda tínhamos as quatro estações do ano.

Já que não temos mais as quatros estações do ano. Já que está um calor do cão, que não deixa ninguém dormir. Já que o vento está parado e que o ar está seco de tudo e me faz tossir sem querer. Já que não há previsão de chuvas para amanhã nem para depois de amanhã. Já que nos tiraram o murinho do jardim, onde sentávamos para ficar olhando a rua e as pessoas passando. Já que do outono que tivemos sobrou apenas esse céu azul-azul. Já que tudo isso e nada mais, vou mudar de assunto. Vou ver o Jornal das 10 e outra hora eu volto.

Uma noite com promessas de outono para quando for possível.

Buenas

segunda-feira, março 26, 2007

Sem mais ilusões

Trilha alternativa: uma valsa qualquer, mas de Strauss...


Desisto. Vou envelhecer como deus quer. Outro dia, resolvi enfrentar os sinais do tempo, apelando para os avanços da farmacologia moderna. Comprei dois cremes fantásticos, último lançamento da linha de neurocosméticos. A vendedora, uma entendida, me garantiu que os produtos eram dermatologicamente testados e que eu ficaria impressionada com os resultados.

Francamente, acho difícil me impressionar com isso. Primeiro, porque sempre que me olho no espelho tiro os óculos e aí só me vejo muito vagamente. Não me enxergando em detalhes, acho pouco provável que me encontre em condições de avaliar o resultado dessas poções milagrosas. Depois, porque as coisas que me impressionam genuinamente são de outra grandeza. Fico estarrecida é com as manchetes de jornais, com as histórias de vida que capto no ar, com as gracinhas dos meus meninos e assim por diante.

Claro, não vou dizer que uma ruga a mais ou uma ruga a menos não mexa com o meu humor. Tem dias que saio de casa mais satisfeita com o que não vi no meu rosto. E tem dias que saio de mal com o mundo, ainda que conformada e passiva diante do poder imbatível do tempo. Mas tem dias também que fico pensando no que vem primeiro: se a mudança de humor ou se as rugas que querem redesenhar meu rosto. É uma dúvida e trago-a sempre comigo como um conforto para os dias que virão.

Mas comprei os cremes. Os potinhos são maravilhosos, parecem duas caixinhas de jóia e eu amo caixinhas. Mesmo vazias. Em casa, tirei-os logo da embalagem e deixei os dois potinhos bem à vista, na bancada do banheiro, para não me esquecer de usá-los assim que fosse possível. Nisso, foram dois ou três dias, até que finalmente me animei a experimentá-los. Vai que funcionem bem.

Primeiro, lavei o rosto com um sabonete especial. Pois é. Tive de comprá-lo também. Já disse que a vendedora é uma especialista, não disse? E ela me explicou que é assim que devo fazer. Primeiro lavar o rosto com esse sabonete, depois enxugá-lo com uma toalha branca e bem macia e, só então, passar os cremes. Em movimentos circulares de baixo para cima. Parece até simpatia, mas segui todas as recomendações.

Não precisei de mais de uma sessão vaidade para ver que isso não ia dar certo. No dia seguinte, acordei com os olhos coçando, depois o rosto, depois o pescoço e depois os braços e, antes do meio dia, já tinha certeza absoluta de que o que estava sentindo era uma reação alérgica aos cremes dermatologicamente testados e da última geração dos neurocosméticos. Claro.

Tem dias que fico impressionada é com a minha teimosia. Já passei por essa mesma situação umas quinhentas vezes: quando quis usar um esmalte cor de vinho, de marca comercial, que vinha numa embalagem fascinante, de vidro opaco com tampa de aço escovado; quando quis passar um batom rosa choque com ingredientes naturais; um brilho labial importado, que uma amiga me deu de presente; um protetor solar fator 30 não oleoso; perfumes das mais variadas fragrâncias e assim por diante. Tudo me dá alergia. Por isso só compro cosméticos numa farmácia de manipulação, vendidos em embalagens de remédio. Não têm o menor charme.

Por isso também, desisto. Vou envelhecer do jeito que deus quer, mas com bastante discrição, igual D. Mariza, não a do Lula, mas a do vice José Alencar. Vou envelhecer sem adjetivos, fazer o quê? Agora, cá pra nós, maldita lei da gravidade! No Brasil temos tantas leis que não pegam, precisava ser justamente essa para colar assim com tanta ênfase? Meninas, deveríamos fazer um movimento, uma campanha com abaixo-assinado e blog na internet, para exigir dos nossos parlamentares a revogação de pelo menos alguns dos artigos dessa lei. E aí, topam?

Uma noite sem fantasias nem maquiagens nem ilusões. Mas que seja bem estrelada para continuar iluminando nossos sonhos.

Até de repente outra vez.

quinta-feira, março 22, 2007

Tabuleiro de damas

Foto: do imbatível Topi

Ontem, voltando para casa, no auge do horário de pique e em plena avenida do Contorno, flagramos um carro novo da Fiat, discretamente camuflado. Um não, três de uma vez, mas conseguimos registrar apenas este que aí está. De cara, estranhei um pouco a estampa, agora já me acostumei e estou achando-a até moderninha. Pode colar para coleção inverno. Mas, do que esse protótipo deixou escapar, a sua forma basicamente, ela me pareceu a mesma de todos os últimos modelos lançados por qualquer uma de todas as marcas. Mas qual será a verdade que essa realidade esconde? O que virá a ser esse carro camuflado de tabuleiro de damas?

Lembrei de Fernando Sabino. Ainda não fui ver a exposição em sua homenagem, montada no Palácio das Artes. Março já está por um fio e ainda não arrumei tempo para passear. Ó céus! Esses dias mínimos que não acolhem nada! Mas lembrei de Fernando Sabino por outra razão. Ele tinha uma metáfora para falar da realidade e da verdade que, quando li, me encantei. Ele dizia que a realidade serve, entre outras coisas, para encobrir a verdade. E exemplificava com um tabuleiro de damas. Seria branco ou preto? Nem uma coisa nem outra, em sua opinião. Para Sabino, a outra cor que ele é de fato, encoberta pela realidade, é que é a verdade. E para Sabino, como é quase impossível vê-la ou alcançá-la, a verdade só pode ser experimentada pelas vias da fantasia. E é o que fazia com as suas crônicas do cotidiano. Ave Sabino!

Mas não vou gastar maionese para viajar nesse tabuleiro de damas. Já disse que suas formas não sugerem nada de novo, embora deus more nos detalhes. Mas agora estou ocupada com outras coisas. Fiquei pensando no nosso PIB, agora em nova edição, novo formato também e com valores recalculados. Qual será a verdade que essa realidade de números e percentuais esconde? Seja qual for, sempre penso que o Produto Interno Bruto de um país, apresentado também como o indicador de suas riquezas, é absolutamente insuficiente. A verdade é muito maior e, nesse caso, está visível ou, pelo menos, de algum jeito perceptível, nas imagens que retratam nossa realidade. Escapa pelos poros, se esconde nas entranhas dela, mas se insinua no seu relevo e, por isso, é bem mais fácil de ser imaginada.

Fico pensando, que a riqueza de um país deve ser também calculada anualmente e ter o seu próprio indicador, um Riqueza Interna Bruta (RIB), representado pela soma do PIB mais o valor estimado de suas riquezas naturais. Aí sim, o Brasil estaria tendo uma avaliação mais verdadeira e não apenas realista, da sua grande riqueza. E, quem sabe, pularia do 11° para os cinco primeiros lugares entre todos os países do mundo.

Um dia real e pleno de verdades para todos.

Inté

Trilha alternativa: Escravos de Jó, de ninguém...mas é sempre uma boa lembrança.

domingo, março 18, 2007

Por um triz

Agora os americanos ficaram nervosos de verdade! E quando os americanos ficam nervosos, eles ficam muuuito bravos. Nós, nem tanto. Aliás, raramente. Mas os americanos têm essa facilidade, quando ficam nervosos, ficam imediatamente bravos. Acho que é porque são cientes de seus direitos e, por isso, não duvidam de que estão com a razão. Tudo bem, que seja: porque são ávidos consumidores e acreditam piamente na máxima de que o cliente tem sempre razão. O fato é, que tendo a razão ao seu lado, quando se sentem injustiçados ou tripudiados ou enganados ou vilipendiados, ficam nervosos e imediatamente bravos. Tomados por esse espírito indomável, vão à luta, e aí, que se cuidem todos os demais.

Sábado, mais de 50 mil americanos, agasalhados até o pescoço, foram às ruas para protestar contra a guerra do Iraque. Cá pra nós, é muita gente! Para mim, é até muito mais do que muita, considerando o frio que estava fazendo lá. Só estando muito bravo mesmo para cometer essa insanidade, não é não? E 50 mil, venhamos e convenhamos, qualquer criança sabe disso, é muito mais que 2 mil, - o total de ex-combatentes e ainda partidários da guerra que também foram às ruas, defender a permanência dos americanos no Iraque.

E 2 mil é menos ainda, porque, além dos 50 mil americanos que protestaram em Washington, houve manifestações em várias outras cidades americanas, inclusive hoje, e em vários outros países, como Bélgica, Malásia, Japão, Espanha, França,Turquia e Grécia. Não tive notícias de protestos no Brasil, mas eu entendo. Primeiro, não temos a mesma facilidade dos americanos para ficarmos bravos e, depois, estamos muito ocupados com a nossa guerra particular. Ainda não ficamos bravo o suficiente para irmos às ruas. Levamos mais algum tempo para isso. Mas já estamos reagindo bem. Ontem, no Rio de Janeiro, palco da nossa guerra civil, foram fixadas 700 cruzes na praia de Copacabana, representando cada uma das vítimas da violência naquela cidade, desde o início de janeiro. Isso é um começo, não é não?

Mas voltando aos americanos, eles estão começando a ficar também impacientes com bush, aquele que não precisa mais assinar o Tratado de Kioto, pois teremos coisa melhor pela frente. Eles estão perdendo a confiança em bush, sabe como é? Isso é a pior coisa que pode acontecer a qualquer pessoa. O que dirá a um presidente! E a última vez que os americanos perderam a paciência com um presidente, eles o mandaram de volta para casa mais cedo. Lembra do Nixon? E a última vez que os americanos ficaram bravos com um presidente belicoso, o mesmo Nixon, por coincidência, ele teve de chamar a tropa de volta para casa mais cedo, antes do final da guerra, ou melhor, antes de vencerem a guerra, se é que alguém acreditava que isso ainda era possível naquela época. Assim como hoje, né? No Vietnan, como no Iraque.

Eu vi. Finalmente eu vi, neste domingo, dia 18 de março de 2007, alguém em Washington, segurando um cartaz, pedindo o impeachment de bush. Estão ficando impacientes, não disse? Mais do que isso, eu li, numa das infinitas páginas da internet, a notícia de que o procurador-geral do Tribunal Penal Internacional, Luiz Moreno Ocampo, um argentino, reconhecer, ainda que hipoteticamente, a possibilidade de um dia o primeiro-ministro do Reino Unido, Tony Blair e o presidente dos Estados Unidos, bush, serem processados pelos crimes cometidos no Iraque. Não estou dizendo? Está pintando um clima nessa novela.

E não são apenas os americanos e o mundo que estão ficando cheios dessa guerra não. Os próprios iraquianos estão por um triz e com muito mais razão. Nove em cada 10 deles dizem viver sob o domínio do medo. Temem, sabiamente, que a violência da guerra, mais dia menos dia, alcance a eles ou às pessoas com quem convivem muito proximamente. Respondendo à mesma pesquisa, realizada pelo jornal USA Today, pela rede de televisão ABC, pela BBC de Londres e pela rede de TV alemã ARD, 82% confirmaram não confiar nas tropas de coalizão, e mais de dois terços, disseram preferir a proteção das próprias forças de segurança iraquiana. Isso é um sinal de exaustão. Será que bush vai entender?

Segunda-feira, quando chegar à Casa Branca, bush terá nas mãos uma ótima justificativa para retirar as tropas americanas do Iraque. Não terá outra oportunidade como essa. Não encontrará outra saída mais honrosa do que essa: o desejo do povo americano. Vai? Mas será que bush vai entender isso? Será que a indústria armamentista americana e suas subsidiárias pelo resto do mundo terão ouvidos para captar esses sinais?

E, voltando à nossa guerra civil particular, será que vamos aprender a ficar bravos também, a subir nas tamancas e a rodar a baiana? Será que vamos dar sinais da nossa exaustão diante das estatísticas, cada vez mais gordas, da violência não só no Rio, mas em todas as grandes cidades do país? Será que vamos ser capaz de nos mobilizarmos para, juntos, buscarmos saídas mais consistentes da barbárie em que nos metemos?
Será? Será? Será?

Uma semana de suspenses pela frente.....

Mas que seja plena de luz e paz para todos e sempre.

Inté.

PS: Ia me esquecendo:
Trilha alternativa:
Tá com medo?, de Arnaldo Antunes. Não é a que gostaria, preferia Da aurora ao luar, mas é a que está sendo possível hoje.

quarta-feira, março 14, 2007

Cenas da cidade

Foto: idem, idem, idem

Queria ver o pôr do sol lá de cima, do topo do mundo. Mas não tem dado tempo. O jeito é arrumar brechas na cidade e descobrí-lo no meio dos prédios, postes e antenas. Ainda assim, é lindo. A fartura de cores no céu esconde a cidade no meio da penumbra e, por alguns instantes, nos faz esquecer das buzinas, da correria do dia, do zum-zum-zum do rádio e dos verbos imperativos, gritando dos três mil quinhentos e tantos out-doors espalhados pelas ruas. Por alguns segundos, durante aquele pôr do sol, mergulhamos no silêncio e isso é o suficiente.

Um pôr de sol para todos, farto de cores e luzes, nos espiando por uma brecha da cidade.

Inté, até quando der

segunda-feira, março 12, 2007

Previsão dos ventos

Trilhas alternativas: sempre com Caetano Veloso, em "a foreign sound": Smoke gets in your eyes ou Jamaica Farewell

Só sei que o que existe de vivo dentro de nós é sopro. É vento puro que nos empurra pra frente e pronto. Tem vez que rodopia e nos leva para um lado ou para um outro, até bem diferente daquele que imaginávamos. Tem vez que é furacão. Nos joga fundo, mas é de um lado para o outro. Joga com vontade mesmo e, onde damos de cair, entramos de cabeça e alma seja lá no que for. É a variação que mais gosto e a que tenho mais receio também, porque é nessas horas que a gente costuma também quebrar a cara. E aí, esse sopro que é vento dentro da gente pode virar um ciclone e nos fazer ficar rodando sem direção alguma. Aí já não gosto. Prefiro a calmaria. Quando o vento vira sopro de novo, e fica só aquela brisa. A gente dando tempo ao tempo. Mas seja qual for a previsão dos ventos, o que existe de vivo dentro da gente é sopro. É fugaz. É instante. Não mais que isso. A gente é que se ilude e acha que é história. Mas não é. É quase nada no tempo do mundo. É segundo, se muito. E se está aqui, não está mais. O que existe de vivo dentro de nós é tão ligeiro que nos escapa. Mas se foge das nossas mãos é porque tem de ir mesmo. É o rumo que deu de seguir. Só isso.

Um dia de calmaria para todos. Se quiserem, furacão.

Buenas

quarta-feira, março 07, 2007

Sempre alerta!

Trilha alternativa: Um minuto de silêncio em homenagem aos mortos do Iraque

Não tenho nada contra George W. Bush. É só um homem, que no final vai morrer como todos nós. Quem me aborrece profundamente é a sua personagem, o presidente bush, aquele que não assina o Tratado de Kioto, mas agora, já quase. É, sem dúvida, o pior desempenho no pior momento da história dos Estados Unidos. Se fosse possível, o melhor seria descer o pano rapidamente, mas estamos condenados a assistir ao seu espetáculo até o final e sem direito a pipoca nem jujuba. Ai de nós!

Também não temo George W. Bush, um homem patético, que tropeça nas escadas, engasga comendo pretzel, troca nome de pessoas, de lugares, erra na conta, no copo, e não sabe onde estão guardadas as suas meias. Ele não me assusta. Temo é sua representação e a limitada visão de mundo da sua personagem. Tenho pavor do seu jeito impulsivo de tomar decisões. Tremo quando a vejo na tevê, com seus olhinhos apertados e seu sorriso de banda, anunciando alguma novidade. E temo, radicalmente e principalmente, todos aqueles que pensam por ela.

Como George W. Bush, que já foi sócio fundador de uma empresa petrolífera, vendida para a Harken Oil & Gas, pouco antes de se eleger presidente, todos os seus maiores colaboradores são oriundos do mesmo setor. Dick Cheney, conforme informou Eduardo Galeano no seu artigo Humor Negro, acumulou sua fortuna pessoal na empresa petrolífera Halliburton. Condoleeza Rice integrou a diretoria da empresa petrolífera Chevron entre 1991 e 2000. E assim por diante. Agora, a trupe mambembe desce ladeira abaixo, para matar dois coelhos numa cajadada só.

Dizem que bush vem discutir com o Brasil uma parceria na produção do novo combustível verde e amarelo: o etanol. Eu acredito. Os americanos amam de paixão qualquer coisa que tenha quatro rodas, um volante e um espelho retrovisor. O maior pesadelo para eles é, um dia, ficar sem combustível para passear on the road ou off road, que seja. Acho que é uma boa razão. Mas os entendidos, que sabem ler nas entrelinhas, dizem que ele vem provocar o poder de Hugo Chávez. Não vou nem tomar conhecimento, porque seja lá o que for que ele venha fazer aqui, me dá é medo. bush, a personagem, tem o poder incontrolável de transformar em munição pesada, com um simples toque de mão, todo ouro e toda lata que encontra pelo caminho.

Como se não bastasse a nossa guerra particular! Ai, ai. Só o Rio de Janeiro já acumula 310 mortes anunciadas nos jornais, desde o dia 1º de fevereiro. Só um pouco menos que as 785 mortes ocorridas em todo o Iraque e noticiadas pela Folha de São Paulo, no mesmo período. Desde o início da invasão americana, em março de 2003, a história do fim do Iraque se confunde cada vez mais com uma história da barbárie moderna.

Li num estudo que pesquei na internet, que a taxa de mortalidade no Iraque, antes da chegada de bush, era de 5,5 para cada grupo de mil pessoas, durante o período de um ano. Depois da invasão, esse indicador subiu para 13,2. Ainda segundo esse estudo, até junho de 2006, o número de mortos no Iraque atingiu a casa de 654 mil 965 pessoas. Dessas, 601.027 foram provocadas por causas violentas. Guerra é guerra. E burrice também mata.

Pois se continuássemos passeando no mapa mundi, descobriríamos outros tantos iraques, com estatísticas mais magras, mas não menos assustadoras, que enfrentam, nesse exato momento, o mesmo poder de fogo da máquina mortífera de bush. E é só por isso que temo sua visita ao Brasil e aos países vizinhos. O clima já não está bom e vem ele transformar mais lata em munição? Vou fingir que não o vi por aqui. Quem sabe ele também passa e não nos vê?

Um sonho leve e sempre alerta para todos! E que os anjinhos da guarda redobrem a sentinela nestas próximas noites.

Até mais ver.

domingo, março 04, 2007

Cálice

Trilha sonora: Vou de Chico. Censurado

Estava distraindo o tempo e resolvi reler algumas fábulas fabulosas de Millôr. Dei de cair, justamente, naquela: Os perigos da filosofia. Resumidamente, a história é a seguinte: cinco amigos estão reunidos numa sala vazia, se escondendo da polícia. Eram subversivos, como se dizia naquela época, não ladrões. Para passar o tempo, o mais velho deles propôs um desafio. Os outros quatros teriam de responder qual o jeito mais rápido e fácil de preencher o vazio daquela sala de maneira compacta.

O primeiro sugeriu encher a sala de palha. Foi uma boa resposta, mas a palha não preencheria o espaço de maneira compacta. O segundo escolheu a areia, mas, também a areia não ocuparia todo o espaço e, além disso, os cinco amigos teriam de abandonar a sala para levar a cabo esse projeto. O terceiro propôs ocupar o espaço com água. Dwârr...morreriam todos afogados! Por fim, o último levantou-se de onde estava e apertando o interruptor, encheu a sala de luz. Foi a melhor solução, além do que, a luz é um elemento cheio de nobres significados.

Mas, ao acender a luz, a polícia, que estava na espreita do lado de fora, confirmou a presença dos suspeitos, invadiu a sala e metralhou os cinco subversivos! Moral da história, segundo Millôr: quem está na merda não filosofa.

Ele foi cruel, admito. Talvez eu seja cruel também no que estou pensando aqui agora. Mas há momentos em que é muito complicado mesmo manter a compostura em nome das aparências ou da imagem que o outro constrói de nós. Estou pensando que Renato Janine Ribeiro, quando escreveu seu artigo na FSP de uns dias atrás, comentando a morte do menino João Hélio, e que provocou tanta polêmica, pode ter se lembrado do conselho de Millôr. Renunciou à filosofia e escolheu expor a sua perplexidade. Não o recrimino por isso e me solidarizo com ele.

Mesmo querendo ler, loucamente, qualquer coisa que me ajudasse a entender melhor o caos em que estamos vivendo, reconheço que as palavras não dão conta de descrever a barbárie. Mas agora, agora que a vida retomou o seu curso normal, que a morte de João Hélio virou estatística, cedendo lugar para a morte dos franceses, da avó arrastada até a morte pelo neto de 12 anos, e outros tantos casos que não fico mais contabilizando para não perder a compostura, agora, acho que é hora de retomarmos a filosofia.

Que seja Rouseau, como sugere Janine Ribeiro. Que seja Platão. Que seja quem for, mas que seja capaz de nos oferecer mais uma oportunidade para refletirmos sobre o valor da vida e, quem sabe, reencontrá-lo. Até Nietzche é melhor que nada. Opa! Lembrei uma frase. Uma frase que o Cláudio um dia já havia se lembrado: vou fazer coisas grandiosas nessa vida. Não sei quais são, mas elas serão o terror da terra. Nietzche.

Será isso o que esses meninos desestruturados e desamparados estão procurando? Deixar a sua marca na terra? Ter os seus quinze minutos de fama? Será que se apropriaram da violência como uma forma de expressão? Como um pintor que joga a tinta numa tela em branco para ver no que vai dar? Um poeta que desenha uma palavra no papel vazio, para dela brotar um verso? O que será que esses meninos estão gritando que não conseguimos, ou não queremos, ouvir? Será que estão incomunicáveis? Ou será que pedem socorro? Será que pedem limites? Ou será que não estão nem aí?

Talvez Millôr tenha razão. Melhor não filosofar. Melhor lavar os pratos. Quem sabe amanhã...

Um dia de luz e paz, sempre.

Inté.

Ôpa! Lembrei: Chico. Cálice.





quinta-feira, março 01, 2007

Cenas da cidade

Foto: Minha outra vez

Fui descendo a Amazonas, virei à direita em direção à PUC Minas e parei no sinal, em frente ao portão do Galba Veloso. Parei e vi. Será que ainda estamos vivos? Ou ficamos loucos? O imperialismo é um tigre de papel. Essa pichação é do tempo das travessuras engajadas. Parece que foi a séculos atrás. E foi, mas seu prazo de validade ainda não venceu. Viram o que aconteceu com a bolsa de valores de Nova Iorque e do resto do mundo depois do espirro da China? O tigre, mais que todos, tremeu. Viram o que aconteceu com a bolsa da China? O novo candidato a tigre de papel tremeu só por conta do anúncio de uma medida inocente, besta e corriqueira: as autoridades chinesas queriam taxar os rendimentos auferidos em bolsa. Conheço essa história. Quem não? Voltaram atrás. Os tigres tremem e nós, aqui, acuados por origamis de papel. O sinal abriu e fui embora.


Um dia ensolarado e um móbili de passarinhos coloridos de origami, balançando com o vento que entra pela janela.

Tiau

PS: Meu adola falou que, no mercado financeiro, uma grande crise se forma a partir de repetidas pequenas crises. Os investidores vão se desgastando, estressando, perdendo a paciência, ficando impulsivos e, de repente, pronto, o caldo entorna. Avi!