Ainda existem coisas nesta vida que podem ser consideradas simples. Assim, de cabeça, não me vem nem um exemplo, mas existem. Tirando essas, todo o resto é bastante complicado. Mesmo as que não eram, tornaram-se. Escovar os dentes, por exemplo. Era simples. Você comprava uma teck de boa qualidade e, três ou quatros vezes por dia, escovava os dentes e estava tudo muito bem feito.
Depois, surgiu o fio dental! Não era mais suficiente apenas escovar os dentes, era preciso uma limpeza prévia. Agora, nem só isso basta. Na semana passada, fui fazer a consulta anual no Serviço Odontológico e conheci mais alguma inovações. Recebi uma verdadeira aula, de quase 45 minutos, sobre como escovar os dentes e ser feliz para sempre. E saí de lá com três novas escovas, que deverão ser utilizadas em cada uma das três etapas da escovação. Mas, antes, tive de demonstrar ser capaz de dominar as novas técnicas para utilização do fio dental, bem mais eficientes que aquelas que adotava até então. Só que, agora, vou precisar de pelo menos 30 minutos diários só para escovar os dentes. Não é nada simples.
Mas outras coisas já nascem complicadas. Eleições, por exemplo. Sempre foram processos complexos. Mesmo naqueles momentos em que se tornaram meramente plebicitárias, foram processos complexos. Não importa o número de partidos que está na disputa nem quais são as regras em vigor, são os movimentos das peças no tabuleiro eleitoral que tornam esse jogo bastante sofisticado. Como os candidatos percebem suas chances na disputa e como se movimentam e como os eleitores interpretam esses movimentos e definem suas preferências, expressas no voto, tudo isso é muito complexo.
As últimas eleições municipais no Brasil, por exemplo. É impossível compreendê-las apenas a partir da contabilidade final dos votos. O quadro consolidado das siglas e dos candidatos eleitos não revelam todas as histórias que estão por trás de cada vitorioso. E algumas nem são vitórias, mas a derrota do adversário. Outras, nem pertencem à sigla indicada no quadro, pelo menos, não totalmente. Resultam das coligações construídas ao longo do processo eleitoral ou de apoios informais que aderiram àquela candidatura em algum momento da disputa. Enfim, são muitas as variáveis que influenciam a conformação do placar partidário ao final de uma eleição.
Isso sem falar nas acrobacias mentais que o eleitor faz para escolher o seu candidato. No Brasil, os partidos ainda tem um peso muito relativo nesse processo. O perfil do candidato, a percepção que o eleitor tem desse perfil, não importa se correta ou não, são muito mais relevantes que a coloração partidária do candidato. E conta, especialmente, o quanto esse eleitor está disposto a investir nessa participação, livre e espontaneamente obrigatória. Se vai correr atrás de informações ou se vai buscar estratégias para gastar o mínimo esforço, o absolutamente necessário, para chegar a alguma conclusão. Tudo isso torna o processo eleitoral extremamente complexo. E mais difícil e complicada ainda, a compreensão das expectativas da sociedade em relação aos candidatos eleitos.
E as eleições americanas? Essas nem se fala. Apesar de parecerem simples como um jogo de ping-pong, são ainda mais complexas. E essa última, especialmente. Os muros do colégio eleitoral norte-americano foram derrubados e eleitores do mundo inteiro palpitaram na disputa. Nunca vi isso, até chefes de estado declararam seu voto antecipadamente. De Lula a Sarkosy. Mas vai entender o que se passa na cabeça do eleitor. Nos dois casos, ainda dependemos de uma prova dos noves, para compreender exatamente o que aconteceu e o que virá pela frente. Doravante, estamos mesmo condenados a pensamentos complexos e que o nosso anjo da guarda não nos abandone nessa hora.
Inté, quando der.
Ilustração: captada na internet
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