terça-feira, dezembro 16, 2008

Quem será o próximo?

O dilúvio

O ano está se desfazendo, desmilingüindo-se, escorrendo enxurrada abaixo e, basicamente, nem percebi. Só hoje, quando sai de casa, mais cedo do que de costume, me dei conta de que estamos chegando ao fim de mais uma temporada. Vi um ou outro papai noel se exibindo em alguma fachada de loja ou escalando as janelas de alguns raros prédios. Ainda vi outros perdidos nos jardins de outras casas e mais nada. Passei pela Praça da Liberdade e mal reparei os fios de luzes que se enroscam nas palmeiras imperiais e desaparecem no meio das folhagens. De dentro do carro, vi mais a praça se desmanchando no meio do aguaceiro do que qualquer outra coisa.

Estou cismada que agora é muito tarde para encarnar o espírito natalino e sair por aí distribuindo abraços e felicitações pelo novo ano que se iniciará a qualquer momento. Se é que vai. Muito tarde para montar a minha árvore de natal que está perdida dentro de algum maleiro. Mais tarde ainda para procurar o meu presépio português, que guardei em algum caixa, dentro de alguma gaveta, em algum armário que não sei mais qual foi. Está muito tarde e muito sem jeito. Melhor me ocupar com outros afazeres. Dedicar o fim de semana que ainda resta para arrumar gavetas, rasgar papéis velhos, organizar meus arquivos de fotos ou dançar na chuva. Não tomar conhecimento. Deixar passar e adiar os festejos para a próxima temporada. Mal não deve fazer. Acho que nem vai doer.

Estou me convencendo, de verdade, que devemos todos ignorar mesmo essa passagem. Fazer ouvido de égua e desconsiderar solenemente a sugestão de Lula e seus amigos de voltarmos às compras. Estou convicta de que será melhor para todos nós, embora, reconheça, ser difícil resistir a tentação. Ou, então, fazer como Muntazer al-Zaid, o jornalista iraquiano, e distribuir as sapatadas que reprimimos durante todo ano. bush estará dispensado, pois já levou duas. Mas, podemos encontrar novos alvos.

Hoje, agora, a minha sapatada vai para a Suggar, fabricante mineira de eletrodomésticos. É uma história longa, mas vou resumir para justificar a prioridade do meu alvo. Faz dois natais passados, comprei uma secadora de roupas Suggar, para enfrentar a temporada de chuvas. Com pouco mais de um ano, ela estragou. Mas as chuvas passaram e eu deixei pra lá. Essa semana, precisei dela de novo e resolvi tomar providências. Liguei para a Assistência Técnica da fábrica e me passaram três telefones de oficinas credenciadas para fazer o conserto. Liguei para a primeira e a mocinha, muito esclarecida, me disse que faria o serviço sem problema, desde que eu levasse a secadora até lá. Lá, é na rua Tamoios, no centrão da cidade.

- Como assim? - quis saber.
- Minha senhora, a secadora é um produto de balcão e não atendemos a domicílio. A senhora terá de trazê-la aqui, para podermos consertá-la.
- Mas você conhece uma secadora? - quis saber.
- Não. - ela me respondeu.
- Pois então, para você ter uma idéia, uma secadora não cabe dentro de uma sacola de supermercado. Como vou pegar esse trambolho, debaixo dessa chuva, pegar um carro, parar no centrão da cidade, arrumar um lugar para estacionar o carro, descer, no meio dessa chuva, carregando uma tv de 29 polegadas debaixo do braço e levar até o seu balcão?
- Não sei, minha senhora.

Desisti. Liguei para o segundo número. A mocinha, também muito prestativa, falou que me atenderia prontamente, desde que eu levasse a secadora até a loja, que também fica na rua Tamoios.

- Como assim? Foi com vocês que conversei a alguns minutos atrás? - quis saber.
- Não senhora, deve ter sido com a outra loja, do número 700. Aqui é Tamoios, 900.
- Mas porque vocês não podem vir aqui arrumar a secadora?
- Porque esse é um produto de balcão. A senhora terá de trazê-lo aqui.
- Minha filha, a secadora não cabe dentro de uma sacola de supermercado. Não é como um liquidificador, uma sanduicheira. É um trambolho que nunca funcionou direito, do tamanho de uma televisão. Como vou chegar com isso aí, no centrão da cidade?
- Não sei, minha senhora.

Desisti. Liguei para o terceiro número. E a menina, muito simpática, se desculpou e me contou que rompeu com a Suggar a quatro meses atrás. Explicou que tem dificuldades de encontrar peças para reposição e o cliente acaba se aborrecendo é com ela. Agradeci e liguei novamente para Assistência Técnica da fábrica. Disse à mocinha que me atendeu que seu cadastro estava desatualizado e que, dos três números que me passara, só dois poderiam me atender, desde que eu levasse a secadora até a loja. A mocinha me disse que era assim mesmo.

- A secadora é um produto de balcão, minha senhora!

E foi repetindo toda a ladainha que já vinha escutando três ligações atrás. Desisti. Liguei de novo para uma das lojas autorizadas e resolvi engrossar o caldo. Quis saber o nome da oficina, o nome do atendente, o nome do gerente e informei-os que iria encaminhar a minha queixa ao Procon. Imediatamente, o gerente entrou na linha e me disse que o técnico poderia vir a minha casa. Achei isso um escândalo! Mas topei.

- A senhora terá de pagar uma taxa de R$ 50,00 e mais o preço das peças que forem necessárias. - ele me esclareceu.

Pomba! Achei caro, mas nem discuti.

- Sim senhor. - respondi.
- A partir de amanhã, então, ele estará ligando para agendar a visita.
- E qual é o prazo desse a partir de amanhã?
- De três a quatro dias, depende.

De três a quatro dias para ligar e, a partir daí, marcar um dia, que não sei quando, para vir fazer uma visita. Desisti outra vez. Tenho certeza de que ele fez isso de propósito, para que eu desistisse da visita do técnico.

Liguei, então, para o seu Zé Geraldo que, há 18 anos, dá assistência a minha máquina de lavar, uma brastemp amarela que continua trabalhando ininterruptamente todos esses anos. Ele me passou o telefone de um colega que conserta secadoras. Liguei para o rapaz que se dispôs a passar na minha casa no início da tarde, para resolver o problema. Ufa!

- Qual a marca da secadora? - ele quis saber.
- Suggar. - respondi.
- Ich!
- Como ich? - quis saber.
- Não trabalho com a Suggar.
- Por que?
- Porque é muito difícil encontrar peças da Suggar. Não tem no mercado. Aí o cliente acha que sou eu que estou enrolando e briga comigo. Não quero caçar confusão. Sinto muito.
- Então comprei uma secadora descartável?!
- É mais ou menos isso. - disse ele. E se senhora tentar levar na autorizada, vai ver, eles farão um orçamento absurdo que vai sair quase pelo preço de uma secadora nova. Se fosse a senhora, nem tentaria. Desistia já.
- Já tentei. É impossível mesmo.
- Pois é. Sinto muito.

Eu também. Sinto muito. Ainda não sei como vou resolver essa pendenga. Amanhã vou pensar nisso. Mas hoje a minha sapatada vai para a Suggar.

Inté.
Fotos: A primeira é minha, hoje de manhã cedinho.
A segunda, da máquina, pesquei na internet, porque fiquei muito irritada para fotografar a minha própria secadora. Quero distância dela.

4 comentários:

Anônimo disse...

Por que não gosto(amos) de fim de ano: Balanço negativo? Chuvas torrenciais? Imposição de clima festivo? Falta de recursos para mergulhar em compras? Excesso de informação para mergulhar em compras? Mundo parado? Um baita mês de janeiro também úmido pela frente? Saudade de acreditar em Papai Noel?
Motivos não faltam. O que fazer com o fim de ano? Em vez da tradicional festa familiar, uma reunião catártica às sapatadas?

Maite Lemos disse...

Olá Patrícia.
Infelizmente não posso ajudar quanto à secadora, mas adorei seu texto.
Já linkei.
Vai lá ver: www.pensoemtudo.blogspot.com

patricia duarte disse...

Meninas,

Obrigada pela visita. Também não sei o que fazer com o fim de ano e menos ainda com minha secadora. Até desisti, estou me virando como a maioria do povo brasileiro, lavando a roupa em doses homeopáticas. Não tem sido tão ruim assim.
Maite, vou visitar o seu blog em 2009. Já passei por lá, mas estou sem tempo para ler tudo com calma. é o danado do fim de ano, depois volto para passear. bjins.

Fabíola disse...

Adorei a história da Suggar!