sexta-feira, fevereiro 15, 2008

Dá pra ser ou tá difícil?

Pra quem gosta, sexta-feira não tem talvez, é dia de circular. Numa outra como esta, meus rapazes, que não posso mais chamá-los de meninos, vieram me pedir um dinheirinho para esticar em algum lugar depois dos compromissos escolares. Não achei muita graça. Sabia que uma hora isso ia acontecer, mas preferiria vê-los debaixo de nossas asas, participando dos lanchinhos especiais da sexta e depois de uma sessão cineminha no sofá da sala, com pipoca e guaraná. Acho que isso nunca mais. Ou só de vez em quando, se não tiverem nada de mais ou menos melhor para fazer.

Já que seria inevitável, tirei duas notas de 10 reais da carteira e dei uma pra cada um. A reação foi instantânea e uníssona:

- Que isso mãe! Perdeu a noção!
- Uai, como assim? Dez reais é muito dinheiro, são dez notas de 1 real, hem?

O mais velho, mais ponderado, mais sensato, mais diplomata, suspirou fundo e abriu negociação.

- Mãe, a não ser que vocês queiram sair no meio da noite, na hora que for, para nos buscar onde estivermos, 10 reais não dá nem pra sair, quanto mais pra voltar pra casa.

Sabia que era pouco, mas por que haveriam de querer muito? Por acaso estariam pensando em sentar numa mesa no Favorita e pedir a carta de vinhos ou um prato personalizado? Dez reais já é mais do que suficiente para hidratar. Mais do que dá para pedir uma coca e se distrair até a hora de ir embora. Ou não? Mas considerando que esperava vê-los de volta em casa o quanto antes, abri a carteira novamente e tirei duas de 20. O mais novo deu-se por satisfeito, afinal, iríamos mesmo buscá-lo na hora que fosse, porque ele não tem idade para ficar zanzando pela cidade no escuro da noite. Mas o mais velho nem estendeu a mão para garantir ao menos a saída.

- Mãe, com 20 reais eu vou, mas não dá pra voltar e nem pra ir a lugar nenhum. Manera, né!

Acho que dá mais do que para ir. Dá para ir de ônibus e voltar de táxi, se quiser. Já fiz isso muito quando tinha a idade dele. Está certo que meus amigos e os lugares que me interessavam estavam todos por perto. Hoje, parece, tudo que é bom é longe. Mas se 20 não dá, quanto é que é o suficiente? Será que esses meninos não aprenderam na escola a conta de dividir? Será que não sabem compartilhar a conta? Será que não sabem viver com o bastante que tem?

- E aí mãe, sai um cinquentinha ou não sai?

Cinquentinha! Olha só quem não tem noção. Com cinquentinha eu faço um sacolão para a semana inteira e ainda me dão um troco. Com cinquentinha, abasteço o carro para rodar de segunda a sexta pra baixo e pra cima e ainda sobram alguns litros para passear no final de semana, se não for muito longe. Com cinquentinha, compro três sandálias coloridas na Feira de Artesanato da Afonso Pena e, com o troco, se procurar bem, compro um brinco de prata com design bem original. Com cinquentinha, posso ir na Savassi e comprar dois livros garimpados na estante de literatura que não vou me arrepender.

Outro dia, no apagar das minhas férias encroadas, fui com uma amiga na Savassi para fazer um teste. Um teste não, uma pesquisa. O que conseguiríamos comprar na Savassi com cinquentinha? A pesquisa fracassou, porque era quarta-feira de cinzas e a maioria das lojas emendaram o feriado. Mas, ainda assim, com cinquentinha, conseguiríamos comprar um oratório de caixa de fósforo da Serjô (18 reais), uma tulipa linda (4,50) na La Tésse, uma meia anti-derrapante (12 reais) na Boto Brasil e uma camisola de algodão deliciosa (19 reais), numa loja que me esqueci o nome. Ficaríamos devendo três reais e cinqüenta centavos, mas acho que daria para negociar.

Poderíamos, se desse na telha, comprar um par de congas preto da Boto Brasil por 40 reais e duas tulipas. Ou um anel na Via Láctea (44 reais) e uma tulipa. Ou um vasinho de rosas brancas (38 reais) da La Tésse e uma meia antiderrapante para andarmos dentro de casa nas noites mais frias. Enfim, com boa parte do comércio fechado, ainda assim faríamos uma grande festa com cinquentinha. Grande é um exagero, tudo bem, mas, com cinquentinha, passaríamos uma tarde bem divertida e voltaríamos para casa com alguns agrados que nos fariam felizes por muitos e muitos meses.

Já estava fazendo novas contas, quando o meu mais velho retrucou outra vez:

- Tudo bem mãe, já sei, já sei, tem muita gente que vive o mês inteiro com cinquentinha. Com cinquentinha salvaria a vida de muitas criancinhas abandonadas por esse Brasil afora, poderia agasalhar meia dúzia de velhinhas no asilo Dom Bosco, comprar material escolar para os meninos carentes do Lar São Benedito. O que mais, mãe? Poderia mudar o mundo, né? Mas hoje não, mãe, é sexta-feira. Hoje só quero dar uma saidinha. Dá pra ser ou tá difícil?

Pra todos, um fim de semana pra ser, pois, como diz meu pai, mais vale um gosto do que cem vinténs!

Buenas.

Um comentário:

Anônimo disse...

Ai, ai, meu futuro...