domingo, março 29, 2009

O apagão

Por uma boa causa

É claro que ficamos no escuro. De oito e trinta da noite até nove e trinta do último sábado, ficamos no breu. Eu participei do apagão! Entrei no clima. Estou no clima faz tempo! Não é de hoje que dei um apagão no mundo. Me afastei. Desliguei todos os contatos para não me deixar contaminar pelo falatório desorientado dos analistas que tentam, sem sucesso, entender para onde essa crise está nos empurrando.

Que esse mundo, do jeito que vinha vindo, ia dar errado, todas nós já sabíamos. Que agora precisamos, com urgência, escapar do centro desse ciclone, também sabemos. Que, para isso, precisamos reiventar o nosso jeito de estar no mundo, mais uma vez concordamos. Só que é exatamente aí que mora o problema. Que jeito é esse que vamos inventar? Nem Anthony Giddens, o arquiteto da terceira via, nos ajudou muito com sua entrevista à Folha de São Paulo, neste domingo.

Que a crise financeira global está exigindo uma redifinição radical da sociedade em que vivemos, sabemos. Que esse mundo novo terá de inventar um modelo de desenvolvimento auto sustentável, mais igualitário, solidário e tolerante, também sabemos. Que será diferente de tudo o que já aprendemos até hoje, já imaginávamos. Mas tudo isso em nada nos ajuda a avançar. Fazem parte do mesmo falatório nosso de todos os dias.

O que urgimos nesse momento, sem demora mesmo, são das práticas que tornarão possível a retomada da nossa história na Terra. E para enxergá-las com nitidez, precisamos, sim, dar um apagão no mundo, desaprender a lógica que nos fez entendê-lo até aqui, buscar alcançar novos pontos de vista para reabrir os olhos de frente para novas paisagens, novas possibilidades. Aí sim, quem sabe, conseguiremos ver essas práticas inovadoras de que tanto precisamos.

Mas, por enquanto, ainda estamos na escuridão. Num apagão criativo, para não embarcarmos no pessimismo alheio.

Inté

Foto: minha, no últmo sábado, do escritório nas escuras.

quinta-feira, março 26, 2009

??????????


O que exatamente significa éon? Qual a medida exata de um éon? E antonomásia? De onde vem? Será que dói? Será que epizêuxis nos salvaria das grandes tragédias? Onde fica Ougadougou? E Eritréia? Quantas pessoas já conseguiram alcançar o topo do Monte Everest ou Monte Chomolangma ou Qomolangma, em bom tibetano? Quem vai enfrentar a Belamcanda chimemsis, essa herbácea rizomatoza que ameaça o meio ambiente tanto quanto nós? Como vamos derrotar as plantas exóticas invasoras? E quanto é um trilhão de dólares? Qual a medida exata em linha reta de um trilhão de notas de um dólar? Seria suficiente para dar a volta em torno da terra? Sobrariam notas para mais algumas voltas? Ou não?

Se minhas dúvidas fossem só essas, estaria feita. Mesmo se fossem outras, mas da mesma natureza, estaria com sorte. O google resolveria todos os meus problemas. Mas a minha ignorância é muito maior e engorda dúvidas muito mais indigestas. Enquanto a terra gira à nossa revelia, o mundo vira de pernas para o ar. Nem que estivesse com tempo para ler os jornais todas as manhãs, ouvir o noticiário das rádios e da televisão, desconfio que não conseguiria entender niente de nada. E não vou nem tentar provar, porque estou na correria de sempre e, pior, sem carro. Hoje fazem 20 dias que renovei minha carteira de habilitação e até hoje não a recebi em casa, como me prometeram. Dá para entender? Também não.

Se a ignorância é inevitável, vou desfrutá-la. Quando o céu ficar mais claro, o mar estiver para peixes novamente e o vento soprando a favor, vou me deitar numa rede, com todos os jornais do dia, e devorá-los letra por letra. Vou ouvir todos os noticiários, das rádios e da televisão, e ver se pego no tranco. Hoje não, porque já é amanhã e tenho de levantar muito mais cedo do que gostaria.

Inté.
Foto: Pesquei na internet. Da AFP/Ahmad Zamroni

quarta-feira, março 11, 2009

Persistir, é preciso

Quem quer ser milionário?
Persistência. É sobre isso que estou pensando. Mas não vou me arriscar a dar uma de entendida, porque não sou besta. Ainda mais que nem tive tempo de ler as críticas e, para ser sincera, foi melhor assim. Agora, a única certeza que arrisco é de que gosto de bons filmes. Gosto tanto quanto gosto de filmes ruins e, admito, alguns até execráveis. Mas gosto. Gosto, por exemplo, de todos os filmes ruins de Adam Sandler, desde 1996, indicado oito vezes como pior ator do ano. E daí? Se me fez rir, me ganhou. E tem mais, para o meu caçula, Adam Sandler é o cara. Não vou discordar. Gostei até de Idiocracy, de Michale Judge. Esbarrou no meu limite, mas gostei. Me deu medo, porque é muito verossímil. Caminhamos muito rapidamente para o cenário montado por Judge. Deus me livre!

É claro que, podendo escolher, prefiro os melhores. Se vou sair de casa, pegar esse trânsito infernal e entrar numa fila para comprar o ingresso e em outra para entrar na sala de cinema, prefiro os melhores. Filme ruim, vejo na televisão. E nesse final de semana sai de casa. Depois de passar 15 horas num curso de atualização para renovar minha carteira de motorista, achei que merecia ver o melhor dos melhores. Sem ler as críticas, como já disse, segui a indicação da academia e fui assistir ao filme de Danny Boyle: Quem quer ser milionário?. Tinha uma vaga idéia da história. Jamal, um menino pobre, que trabalhava servindo chá em uma companhia de telemarketing, por algum acaso desses da vida, cai num programa de auditório, concorrendo a um prêmio milionário, respondendo perguntas disparatadas sobre qualquer assunto.

Também ouvi dizer que o filme guardava alguma semelhança com Cidade de Deus, de Fernando Meirelles. Esse detalhe quase me fez desistir. Não porque não tenha gostado de Cidade de Deus. É fantástico. Mas já estava suficientemente encharcada de realidade, depois de passar 15 horas num cubículo mal ventilado, com 26 desconhecidos, de idade média de 55 anos, mal humorados e descrentes, esculhambando com o governo, que é sempre o culpado pelas nossas falhas, e nem podendo polemizar, para não perder o foco. Isso, num final de semana! Considerei minha missão mais do que cumprida e, portanto, estava liberada para buscar apenas distração. Mas venci a preguiça e o preconceito e segui a indicação da academia.

O filme de Boyle me pegou na contramão. Não me lembro mais de detalhes de Cidade de Deus, a não ser da cena de abertura, com os meninos correndo atrás de uma galinha. Quem quer ser milionário? também começa com uma corrida, da polícia atrás dos meninos. Pode ter sido até intencional, uma homenagem, mas tirando isso, nada me fez lembrar de Cidade de Deus. Também não li o livro Sua resposta vale um bilhão, de Vikas Swarup, que inspirou o filme. Assim, plenamente desinformada, não me dei nem ao trabalho de querer captar fielmente a mensagem que Boyle pretendia passar com a sua recriação. Deixei fluir.

Depois de um tempo, deixei a história de lado, passei de liso pelas cenas mais chocantes e me concentrei em Jamal. Segui-o como se o espionasse. Me pus no lugar do inspetor que o interrogava. Queria entender as razões de Jamal. Mas foi Salim quem me ajudou. Quando entrou na sala para entregar a chave do carro a Latika e ajudá-la a fugir, Salim resumiu tudo: Jamal não desisti. Nunca. E foi isso que ficou. O filme me fez pensar na persistência, que é quase igual teimosia, mas é bem diferente e muito mais difícil de praticar. Persistir é perseverar, mas sem embirrar, sem empacar. É correr atrás, fazer acontecer, não por intransigência, mas porque está escrito. Porque é nisso que se acredita.

Desconfio que hoje nos falta algumas doses a mais de persistência e, por isso, estamos atolados na teimosia de uns poucos. O mundo acabou, mas uns poucos insistem em remendá-lo, tentando mantê-lo como sempre esteve. Ficamos empacados na virada. Talvez nos falte uma Latika para fazer brilhar os nossos olhos, inspirar os vôos da nossa imaginação e nos fazer sonhar o outro mundo possível. Talvez nos falte persistência, porque esse outro mundo ainda não está escrito. Talvez, ou não. Vai saber.

Inté quando tiver tempo.